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porto velho, terça-feira 19 de março de 2024
A proliferação do coronavírus no Brasil sacramenta em definitivo a tendência à recessão econômica e à consolidação de um nível de desemprego na ordem de 12% da força produtiva, além de hegemonia do trabalho informal, que se tornam a base da involução nacional desde 2015. De lá para cá, convivemos com desempenhos irrisórios de nosso Produto Interno Bruto, chegando-se, neste exato dia 23 de março de 2020, a uma previsão de crescimento de 0,2%, ela que era, desde final do ano passado, de 2,4%. Entretanto, essa última previsão depende de que o coronavírus não se propague mais, o que, conforme também podemos perceber pelos dados de hoje, infelizmente não acontecerá. O país vai parar social e economicamente, ao ponto de, inclusive, ocasionar-se uma depressão econômica gravíssima.
Por isso, agora é a hora de o Estado assumir a centralidade e o protagonismo que sempre teve na vida nacional, situação incapaz de ser assumida e realizada pelo mercado abandonado à sua mão invisível. O primeiro ponto importante, no contexto da atual crise econômica, é o aumento do crédito público a empresas e populares, por meio da redução exponencial dos juros bancários. Para se ter uma ideia, há poucos dias o Federal Reserve, banco central americano, reduziu sua taxa de juros para 0 a 0,25%. É uma forma de empresas e populares terem acesso a dinheiro para investimento e pagamento de dívidas.
O segundo ponto importante é a manutenção do trabalho. Ao contrário do que pensam os neoliberais e, no caso brasileiro, nosso presidente que já confessou não entender nada de economia, o que mantém os empregos é exatamente a existência de empregos ou, dito de outro modo, o que mantém as empresas é o consumo, e só há consumo amplo se há trabalho, especialmente em economias de cunho subdesenvolvido ou em desenvolvimento, dominadas pelos setores primário (agricultura-pecuária-mineração) e terciário (serviços), como é o caso do Brasil. Nesse sentido, o Estado deve oferecer contraparte ao pagamento dos salários, de modo a efetivamente possibilitar que as empresas reduzam tempo de trabalho e salários. Para garantir os empregos, o Estado não deve deixar que as empresas demitam, e pode fazê-lo pela correlação de redução de impostos e oferta de empréstimos e de pagamento de parte dos salários desses trabalhadores.
Em terceiro lugar, o Estado precisa instituir com urgência um programa de distribuição pública de renda, especialmente aos grupos mais vulneráveis e aos trabalhadores informais, que sofrerão gravemente com a imobilização da situação social e econômica nacional. Por exemplo, há em torno de quase 80 milhões de pessoas no Cadastro Único do Programa Bolsa Família. Para estas pessoas, poder-se-ia aumentar a renda mensal familiar, que hoje é de 189 reais, a fim de que o seu consumo não decresça ao ponto de terem de trabalhar irremediavelmente como condição para conseguirem seu alimento diário, ficando doentes, superlotando os hospitais e, principalmente, amplificando a contaminação pelo vírus, a ponto de torná-la incontrolável, aumentando as mortes das pessoas infectadas[3]. Mais uma vez, os Estados Unidos servem de exemplo: cada cidadão americano receberá, independente de sua renda mensal, um cheque mensal de mil dólares pelo período de três meses. Trata-se do óbvio: sem dinheiro, ninguém consome; sem dinheiro, tem-se o caos social instalado. Como disse o Secretário do Tesouro dos EUA, Steven Mnuchin, “Precisamos colocar dinheiro na economia agora. Se fizermos isso, pensamos que podemos estabilizar a economia”[4]. Ora, nós precisamos aprender com isso.
São três estratégias, entre outras possíveis. Na verdade, são estratégias inultrapassáveis para um verdadeiro e efetivo enfrentamento da crise social e econômica causada pelo coronavírus. E elas inevitavelmente elevarão o endividamento público, assim como as despesas contraídas pelo Estado, uma situação que, em si mesma, não é problemática, posto que nosso país, além de grandes riquezas naturais, consegue gerar riqueza por meio de suas atividades econômicas internas (não consegue distribuí-las bem, mas gerá-las o faz com certeza). De todo modo, o endividamento público, agora mais do que nunca, é o menor dos problemas em uma situação na qual a propagação cada vez mais intensa do coronavírus paralisará a vida social e as atividades econômicas do Brasil, assim como já o fez em outras sociedades, começando pela China e alcançando o poderoso EUA. Nosso governo precisará injetar dinheiro na sociedade civil e investir maciçamente em infraestrutura produtiva, gerando condições para que as pessoas ainda possam trabalhar e consumir, a fim de que a atividade econômica não quebre de vez e, como base de tudo, a fim de que não morram de fome ou instaurem uma situação de caos social sem fim, destruidor das instituições.
É neste momento que somente um Estado de bem estar social ativo e protagonista poderá nos salvar do caos social, do crescimento da miséria, da violência e da doença. É neste momento, portanto, que estamos aprendendo de que somente uma política pública ligada ao bem estar social se constitui em um dos cernes fundamentais de uma democracia sólida, justa e inclusiva.