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porto velho, quinta-feira 28 de março de 2024
O executivo federal não é um mero ornamento aos demais poderes da república. Se é bem verdade que, ontogenética e normativamente, ele está subordinado ao legislativo e ambos ao judiciário, também é uma verdade no mais pleno sentido desse termo que o executivo tem tarefas que não podem ser relegadas apenas ao legislativo e ao sistema político. O executivo federal, por conseguinte, precisa assumir protagonismo em termos de ofertar – primeiro à po-pulação em geral durante o período eleitoral, depois ao legislativo no contexto do seu manda-do institucional –, subsequentemente de discutir e aperfeiçoar e, finalmente, de implementar um projeto político institucionalizado de integração política e de desenvolvimento socioeco-nômico estrutural, direcionado a todo o país.
É importante salientar-se, acerca disso, que o executivo federal tem poder enorme de amalgamar a coletividade brasileira, não obstante suas diferenças, uma vez que (a) dispõe de enorme e bem estruturada máquina pública para promover políticas institucionais e para to-mar decisões estratégicas vinculantes, seja aos demais poderes, seja aos estados e municípios, bem como (b) torna-se hegemônico exatamente pela vontade majoritária da população apta ao voto, o que significa, nesse último caso, que o executivo eleito majoritariamente é e represen-ta sempre um grande projeto nacional a imbricar eleitores/as em um bloco único e razoavel-mente coeso – todo executivo, nesse sentido, é um projeto de nação, um modelo político, por assim dizer. Jair Messias Bolsonaro, por exemplo, teve mais de 55 milhões de votos, um nú-mero extremamente expressivo para garantir-lhe legitimidade política no sentido de impor sua agenda político-social ao país.
Ora, a pandemia do coronavírus, tenho insistido muito nisso, exige de modo pungente e urgente uma agenda comum ao país, proposta, promovida e implementada desde o governo federal. É ele quem pode, por palavras e exemplos, convocar ao respeito às medidas de isola-mento social e de profilaxia sanitária; é ele quem pode organizar o trabalho de governadores e prefeitos em torno exatamente ao combate ao coronavírus; é ele quem pode coordenar, junta-mente com o legislativo, políticas públicas destinadas seja a minimizar a crise socioeconômi-ca decorrente do isolamento social, seja a levar ao desenvolvimento científico necessário para garantir tratamento e, agora, vacinação para este vírus mortal; é ele, finalmente, que tem con-dições de assumir uma atuação unificada que, por sua vez, como que em um efeito de cadeia, possa motivar e, ao fim e ao cabo, exigir responsabilidade gestionária a governadores e prefei-tos, a cidadãos e cidadãs.
Nesse sentido, a recusa ao protagonismo, a postura de boicote e o estímulo ao desres-peito ao isolamento social, sem excluir-se a gravíssima atitude de negacionismo científico e
de deslegitimação dos nossos profissionais de saúde, adquirem um efeito manada, por assim dizer, destrutivo de toda e qualquer perspectiva de combate efetivo, consistente e abrangente ao coronavírus. Não só travando a atuação do Estado brasileiro em termos de um combate incisivo e direto ao coronavírus, em termos ainda da condução do legislativo e de estados e municípios em um projeto e em um direcionamento comuns, mas também colocando em xe-que todas as pesquisas científicas em torno ao vírus e dando exemplo de desrespeito e de vio-lação de protocolos básicos de saúde, o presidente e seu grupo político contribuem para o fra-casso da atuação público-social do Estado brasileiro e se constituem não só no principal obs-táculo à realização de um projeto nacional de enfrentamento ao coronavírus, como também na principal força a decretar o fracasso de todo o esforço ingente – e, em muitos casos, de morte – dos nossos profissionais de saúde. Nós já perdemos a luta contra o coronavírus, dada essa atuação destrutiva do executivo federal.