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    porto velho, sexta-feira 26 de abril de 2024

Desemprego e informalidade representam um golpe de morte em qualquer projeto de desenvolvimento socioeconômico nacional!


Por Leno Danner

15/02/2020 09:37:43 - Atualizado

Os recentes dados do IBGE confirmam uma tendência que vem se consolidando desde 2016 e que em 2019 alcançou seu pico, a saber, a correlação de desemprego estrutural, crescimento da informalidade e estagnação econômica, que impede qualquer possibilidade mínima de crescimento econômico e de inclusão social por meio do trabalho. De grande base e motor de uma sociedade moderna e democrática, a economia capitalista e, nela, o trabalho se tornam entre nós exatamente condição e princípio sem nenhuma importância estrutural, quase como em uma sociedade de castas que não apenas não precisa da – e não leva à – inclusão plena, senão que também pode continuar funcionando muito bem no sentido de favorecer a certos grupos em detrimento de outros.

O que se percebe, portanto, é que a economia brasileira simplesmente naturalizou uma situação de estagnação, de desintegração e de desigualdade ampla, que permite que uma bolha de grupos e sujeitos sociais consiga sustentar-se por meio da convivência cotidiana com espaços de miserabilidade, de exclusão e de violência gritantes. Não há nenhum choque e nenhuma contradição entre situações tão contraditórias, senão que uma aceitação tácita da ausência de outras regras do jogo que não o salve-se quem puder e do sem sentido de critérios normativos mínimos de justiça que possam ser norteadores da vida coletiva e das relações recíprocas. Na atual situação da economia brasileira, aprendemos que a produção da riqueza por meio do trabalho é regida pela lei da selva e não pretende incluir a todos/as, funcionando muito bem sem eles/as. E é nessas situações que o pouco protagonismo público piora as coisas, ou até as causa, as consolida.

Primeiramente, é fato notório que há um jogo de desestabilização política que se constitui na prática básica de nossos partidos políticos e de nossas organizações econômicas mais importantes, como a FIESP, pelo menos no que concerne a uma política federal de indução planificada do desenvolvimento industrial de nossas regiões e da inclusão educacional, cultural e econômica de nossos/as cidadãos/ãs. Tornou-se muito comum e já irritante afirmar-se que o Estado brasileiro é o grande inimigo do/a empresário/a e do/a trabalhador/a, e isso em uma situação em que todos, e principalmente o/a empresário/a, necessitam de auxílio público para começar seu negócio, para pagar seus estudos, para comprar seu carro e sua casa etc. Compare-se o volume de financiamento dessas atividades entre bancos públicos e bancos privados para se ter uma ideia de que negócios de risco não são assumidos pelos segundos, mas fundamentalmente pelos primeiros. Desenvolvimento socioeconômico necessita de planejamento e de protagonismo público, precisando ser planificado. Ele não é espontâneo e não pode ser deixado ao acaso. Empresário/a precisa ser protegido/a e financiado/a, precisa ser orientado/a e treinado/a; trabalhador/a precisa ser formado/a e protegido/a por legislação trabalhista sólida e por direitos sociais básicos. Investimento em infraestrutura – que em geral o mercado não faz, por ser de risco e com lucratividade apenas no largo prazo – precisa ser feito pelo Estado e naquelas áreas estratégicas que efetivamente supram nosso país de recursos básicos para o investimento em sua população, como as energias naturais não renováveis, das quais somos riquíssimos.

O que assistimos desde 2014 e que se enraizou a partir de 2016 com o impeachment de Dilma foi exatamente uma situação de instabilidade política que produziu essa situação de ataque direto ao Estado brasileiro, bem como de sua inação consciente por parte de Michel Temer e depois de Jair Messias Bolsonaro relativamente ao investimento maciço e planificado em projetos de desenvolvimento de médio e longo prazos. Ao invés de agora utilizar as reservas internacionais para conter a subida do dólar, o governo poderia ter se antecipado e investido parte daquele montante na retomada do Programa de Aceleração ao Crescimento, que teria no curto prazo reduzido drasticamente o nível de desemprego e de subemprego, bem como injetado dinheiro no mercado de consumo. Ocorre que a retórica política – que funciona no Brasil às mil maravilhas – apontou para o “excesso de direitos” dos/as trabalhadores/as como a causa do desemprego e do subemprego, mas nem o fenômeno da terceirização, aprovado por Temer, e nem a nova legislação trabalhista aprovada por Bolsonaro conseguiram reverter a lógica da informalidade que se torna um dos pilares da economia brasileira.

Conforme salientei na pesquisa acima, o Brasil fechou 2019 com 41,1% de sua mão-de-obra economicamente produtiva vivendo na informalidade, isto é, exercendo trabalhos sem carteira assinada, sem recolhimento de impostos e, portanto, sem qualquer segurança jurídica mínima e sem pagamento de tributos ao governo. Isso sem contar o montante de 11,9% dessa mesma mão-de-obra economicamente ativa que está desempregada e, portanto, sem qualquer renda básica para sua subsistência. Note-se, aliás, que, neste 2019, o PIB brasileiro cresceu apenas 0,89%, menor que o último ano do governo Temer (que foi de 1,8%), o que mostra a vergonhosa inação pública de nosso presidente e, principalmente, o equívoco das políticas econômicas adotadas, principalmente o não investimento em renovação e ampliação da infraestrutura econômica nacional. Para 2020, a previsão é de um PIB na faixa de 2,5%, um número bem razoável, mas que depende de estabilidade política e de indução planificada do investimento, principalmente nas áreas mais estratégicas e mais sensíveis. Nesse quesito, inclusive a retomada de um programa de construção e de reconstrução da infraestrutura material – portos, estradas, ferrovias etc. – e de crédito para pequenas e médias empresas, para a compra da casa e do carro, entre outras coisas, poderia dar um fôlego imediato que deveria ser complementado, no médio prazo, com o desenvolvimento industrial de nossa sociedade.

Este é o verdadeiro gargalo de nosso país. Nossa economia é marcada pela seguinte estrutura: a agricultura responde por 5,5% do PIB; a indústria responde por 18,5% do PIB; e o comércio responde por 76% do PIB. Ou seja, somos basicamente um país de economia terciária, sendo que é exatamente na indústria e em termos de desenvolvimento técnico-científico que se dão a inclusão no trabalho e a distribuição de renda. Da mesma forma, a força de trabalho está emprega nas seguintes áreas: 8% na agricultura; 22% na indústria; e 70% no setor de serviços. Novamente, como se percebe, a indústria responde por uma taxa de empregabilidade muito baixa quando comparada com as taxas de outros países desenvolvidos, ou mesmo de São Paulo, no caso brasileiro, que é nosso estado mais rico.

Nesse sentido, o desemprego estrutural e a consolidação de uma alta taxa de informalidade tão grande estão simplesmente inviabilizando a economia nacional, estão destruindo qualquer possibilidade mínima de um projeto de desenvolvimento e de inclusão socioeconômicos que possam resolver nossos problemas já seculares de pobreza, marginalização e desigualdade. Essa situação foi produzida politicamente e pode ser resolvida politicamente. Mas, para isso, precisamos eliminar essas divisões políticas ingênuas e maniqueístas que foram construídas para nos desunir e, então, para mais efetivamente nos dominar enquanto cidadãos e cidadãs. Bolsonaro é apenas a nova fase dessa situação, a qual atua em duas frentes: na sociedade civil, no sentido de construir uma imagem despolitizada da vida social, em que o conservadorismo cultural e a meritocracia são os únicos valores,; do mercado e do empresário como as tábuas de salvação de nossa crise. Mas a verdadeira tábua de salvação é uma política industrial e social de cunho nacionalista, viabilizada por um Estado ativo, interventor e planificador da vida socioeconômica.  


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