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porto velho, sexta-feira 12 de dezembro de 2025

A doação voluntária de dinheiro a uma igreja é ato de consciência religiosa e demonstração de fé que não depende das formalidades previstas no Código Civil para ser validado.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a um recurso da Igreja Universal, que foi eximida da obrigação de devolver R$ 101 mil a uma dona de casa.
O dinheiro, que foi doado pela mulher, é parte do que ela ganhou na loteria e foi entregue diante da promessa do pastor de que contribuições financeiras resultariam em mais prosperidade.
A dona de casa sustentou a nulidade das doações, que não foram acompanhadas por instrumento particular ou escritura pública, como exige o artigo 541 do Código Civil — a exceção é de bens móveis e de pequeno valor, que podem ser doados verbalmente.
As instâncias ordinárias entenderam que a Igreja Universal deveria devolver o dinheiro. O tema causou divergência no STJ. Relator do recurso especial, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva votou por negar provimento ao recurso.
Para ele, a exigência das formalidades previstas no Código Civil não representa entrave aos atos de liberalidade entre fiéis e igreja. Em vez disso, confere segurança jurídica e garante a legalidade do ato.
“A convalidação do negócio jurídico havido, sem o atendimento às formalidades, implicaria em reconhecer uma nulidade que a própria lei trata de afastar expressamente, o que representaria um contrassenso jurídico”, sustentou.
Abriu a divergência vencedora o ministro Moura Ribeiro, que foi acompanhado pela ministra Daniela Teixeira e pelos ministros Humberto Martins e Nancy Andrighi. Para eles, a doação é legítima porque não se enquadra na definição do Código Civil.
O voto cita doutrina segundo a qual o cumprimento de uma obrigação moral não representa doação como prevista na lei, pois não há o animus donandi — a intenção deliberada de doar para enriquecer alguém.
Como a dona de casa não apresentou justificativa plausível para desfazer a entrega de R$ 101 mil à Igreja Universal, seria temerário e contrário à boa-fé acolher essa pretensão, disse Moura Ribeiro.
“O negócio jurídico não pode ser desfeito porque o ato de voluntariedade fundado no dever de consciência religiosa e demonstração de gratidão e fé não se enquadra na definição da de doação”, concluiu.
Daniela Teixeira acrescentou que não cabe aplicar o Código Civil para uma obrigação natural que a própria dona de casa entendeu por bem praticar.
“Esse tipo de doação não tem por objetivo enriquecer o donatário, mas dar cumprimento a um dever de consciência religiosa que representa, em grande medida, a materialização de usos e costumes sociais.”