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porto velho, domingo 24 de novembro de 2024
Pense
em um senhor da idade, que sofre de Alzheimer e vive em um asilo. O
idoso mencionado recebe por meio do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), mensalmente,
um total de R$ 5 mil.
Contudo,
70% do recebido pelo segurado é destinado à casa de repouso onde reside
e o idoso possui gastos mensais de R$ 8 mil com remédios para o
tratamento de sua doença.
O resultado é um saldo negativo da sua conta bancária todos os meses.
Esse
é apenas mais um de tantos casos existentes hoje em que advogados
previdenciários buscam na Justiça o direito ao custeio de remédios pelo
Sistema Único de Saúde
(SUS). O tal caso referido aconteceu em Joanópolis, município no Estado
de São Paulo, e muitas vezes as ações judiciais do tipo são feitas de
forma gratuita pelos profissionais da área devido à gravidade dos casos e
à falta de condições financeiras das pessoas
envolvidas em questão.
Atualmente,
muito se discute pontos da reforma da Previdência proposta pelo governo
federal como o fim do tempo de contribuição e as regras de transição
colocadas na
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 06/2019. São discussões
importantíssimas, mas que deixam de lado muitas vezes detalhes
importantes presentes na reforma que afetam e fazem uma enorme diferença
para camadas mais vulneráveis da população, como os segurados
idosos.
Um
exemplo é a possibilidade de que seja proibido que o idoso possa
judicializar o seu direito a ter remédios custeados, ou seja, que possa
entrar na Justiça com ações
de fornecimento de medicamentos.
É
o que pode ocorrer caso seja aprovada a proposta de Reforma da
Previdência hoje em discussão na Câmara dos Deputados. Mas é possível
que, por meio de um projeto de
lei com alterações das regras previdenciárias, o brasileiro acaba por
perder o seu direito constitucional à saúde?
A
PEC 06/2019 altera o parágrafo 5° do artigo 195 da Constituição
Federal, de modo que passa a nova redação a determinar que "nenhum
benefício ou serviço da seguridade
social poderá ser criado, majorado ou estendido por ato administrativo,
lei ou decisão judicial, sem a correspondente fonte de custeio total”.
A
introdução dos termos "por ato administrativo, lei ou decisão judicial"
dificulta o acesso a remédios e tratamentos e é inconstitucional, pois
fere o direito fundamental
à saúde presente no artigo 6º da Constituição. Trata-se de um Direito
Social e, logo, cláusula pétrea que também só poderia ser alterada
mediante à convocação de uma Constituinte. Também não é exagero dizer
que a mudança colocada no texto da reforma fere o
Princípio da Dignidade Humana quando proíbe que um idoso possa buscar
na justiça a garantia da proteção de sua saúde. É inconstitucional e
desumano.
Além
disso, é observável que o projeto da Reforma volta a tratar de uma
matéria em seu texto que não é previdenciária, como quando determina o
fim da obrigatoriedade
de recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) por
parte de empresas e o consequente pagamento da multa de 40% a empregados
já aposentados, um tema de caráter trabalhista.
É
fato que é necessário que seja realizada uma reforma do sistema
previdenciário no país com o objetivo de resolver o déficit nas contas
do sistema e outros problemas.
O governo, do seu lado, ressalta o bilhão de reais gasto anualmente por
conta da judicialização da saúde.
Contudo, é preciso que a discussão saia apenas da questão financeira e que sejam observadas as discrepâncias sociais existentes no país e todos os detalhes presentes no projeto. É uma obrigação se manifestar para que tal mudança não seja aprovada da parte de todos que se atentem para o lado humano dessa discussão.
* João Badari é sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados e especialista em Direito Previdenciário
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