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porto velho, domingo 24 de novembro de 2024
BRASIL - Apesar do crescimento da poupança durante a pandemia de Covid-19, a dívida das famílias brasileiras aumentou 11,2% em 2020, mais rápido do que o visto em outros países da América Latina, à exceção da Argentina, "dominada pela inflação", destaca o Grupo Allianz, na 12.ª edição do Relatório de Riqueza Global.
Como resultado, as famílias aqui arcam com mais dívidas do que o conjunto de Chile, Colômbia, México, Peru e Argentina - a razão dos passivos domésticos brasileiros em relação a dos outros países passou de 117% em 2019 para 126%. Isso quer dizer que o endividamento das famílias no Brasil, hoje em 536 bilhões de euros (cerca de R$ 3,4 trilhões), é mais da metade (55,8%) do total da região.
Segundo o grupo Allianz, as dívidas das famílias latino-americanas avançaram 67 bilhões de euros (cerca de R$ 436 bilhões) em 2020, alcançando 960 bilhões de euros (R$ 6,2 trilhões), um aumento de 7,5% ante 2019. Depois do Brasil, o México é outro "peso-pesado" quando se trata de dívidas das famílias na região, com 165 bilhões de euros (R$ 1,07 trilhão). Juntos, os dois países representam 73% do passivo na América Latina.
No Brasil, a dívida das famílias em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) chegou a 46% no fim de 2020, maior do que em 2019 (41%). Além disso, a média de crescimento na última década, de 10%, é muito maior do que a nível global (4%). No entanto, Arne Holzhausen, chefe de Seguros, Tendências e Pesquisa ESG do Allianz SE, afirma que a razão não é "alarmante". Está abaixo da media dos mercados emergentes (49%) e dos níveis da China (61%), Malásia (93%) e Tailândia (89%).
Depois de alcançar a marca inédita de 200 trilhões (R$ 1,3 quatrilhão) em 2020, a riqueza global, medida pelo agregado de ativos financeiros, deve ter novo salto neste ano, conforme as previsões da Allianz Research, "à exceção de uma queda brusca das Bolsas nos últimos meses do ano".
Graças ao avanço da vacinação, à recuperação da economia global e aos estímulos fiscais e monetários ainda em vigor no mundo, o grupo prevê avanço de 7% do montante de depósitos bancários, apólices de seguros e fundos de pensão, títulos de renda fixa, ações e fundos de investimento detido pelas famílias de 57 países (mais de 90% do PIB global).
Segundo relatório do grupo, em 2020, "somas inimagináveis" em incentivos permitiram que o agregado da riqueza das famílias resistisse à maior crise econômica desde a 2.ª Guerra e crescesse 9,7%, 11,6 ponto porcentual acima do PIB global. Assim, pela primeira vez, os ativos financeiros globais alcançaram 300% do PIB mundial.
Juntamente com as quantias enormes de transferências sociais, a "economia forçada" foi o principal vetor do crescimento dos ativos financeiros em 2020, já que os cuidados necessários para evitar a disseminação do vírus impediram que as famílias gastassem estavam habituadas.
As novas poupanças avançaram 78%, para 5,2 trilhões (R$ 33,8 trilhões), em 2020, um recorde absoluto, sendo que pelo menos a metade em todos os mercados considerados teve como destino os depósitos bancários. Esses depósitos, que não requerem uma decisão ativa de investimento, apenas são mantidos na conta, cresceram no ano passado a uma taxa de dois dígitos (11,9%) pela primeira vez na história.
Os Estados Unidos foram o principal destaque, com aumento de 374% desse fluxo. Assim, o país passou a responder por 51% de todos os novos depósitos no mundo, de 31% em 2019. No Brasil, os ativos financeiros brutos detidos pelas famílias aumentaram 13,2% em 2020, com avanço de 28,4% dos depósitos bancários, o mais forte desde 2010.
"Os números principais são muito impressionantes. Mas devemos cavar um pouco mais fundo. A maioria das famílias não poupou realmente, simplesmente depositou seu dinheiro", diz Ludovic Subran, economista-chefe do grupo Allianz. "Meu medo é de que, se as famílias começarem a desperdiçar, o dinheiro acabará no 'consumo de vingança' e apenas alimentará a inflação. Precisamos urgentemente de uma nova 'cultura de economia'."
Holzhausen ressalta que a recuperação da covid-19 está "entrando em águas turbulentas", já que os gargalos na cadeia de abastecimento e as crises de energia não serão resolvidos rapidamente.
No seu Relatório de Riqueza Global, o Allianz avalia que a distância entre os países desenvolvidos e emergentes deve voltar a se alargar assim que acabar a ajuda do Estado aos mais vulneráveis por causa da pandemia. O mesmo deve valer para a desigualdade dentro dos países, especialmente considerando que as perdas educacionais devem dificultar a mobilidade social.
"A pandemia é um desafio muito maior para os países em desenvolvimento. Muito provavelmente, a covid-19 continuará a travar o desenvolvimento econômico nesses grupos de países por muito mais tempo do que nos mercados avançados", diz Patricia Pelayo Romero, coautora do documento.
Ela afirma, porém, que o verdadeiro desafio vem depois, uma vez que esses países se encontrarão em um mundo pós-pandêmico, que tornará cada vez mais difícil para eles exercerem suas vantagens comparativas. "O fechamento gradual do hiato de prosperidade global - o desenvolvimento definidor das últimas décadas - não pode mais ser tomado como algo certo."