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porto velho, terça-feira 24 de junho de 2025
Hoje é o dia de São João Batista, o Santo Precursor, aquele que anunciou o advento do Messias e o batizou no Rio Jordão, dando início ao seu Ministério. É o santo milagreiro desde o nascimento, e no Brasil, tenho certeza, é também o Santo do Amor. A data 24/06, foi escolhida para celebrar seu nascimento, seis meses antes do Natal.
De Norte a Sul, São João consagrou-se como o mais querido dos santos. Com ele, vieram as fogueiras acesas nas danças da roça, as cantigas de ciranda que, antes, mas que hoje, ainda alegram o povo e reúnem famílias inteiras.
Em Porto Velho, antigamente, a tradição virava uma festança! E os quitutes? Ah, os quitutes! Eram mesas fartas nos arraiais, com bandeirinhas coloridas tremulando no terreiro e barracas enfeitadas. Serviam pipoca, bolo de macaxeira, quentão, canjica, mungunzá, milho cozido, milho assado...
Nas quadrilhas, onde a ordem era a alegria, os “cavalheiros” faziam seus salamaleques às damas com flores nos cabelos. Entravam na coreografia caipira, o noivo, a noiva, o padre, o sanfoneiro, o zabumbeiro – eita dia comprido! – Uma noite bem grande, daquelas que a gente torcia para não amanhecer. Era o dia pintado com as cores fortes de Deus, que iluminou os lindos dias da minha infância em Porto Velho.
Dia de começar a achar bonita a filha do vizinho — sem que ele soubesse, é claro — e de se encantar com meninas que vinham de longe, de outros bairros, para dançar com a gente. Era o dia, no qual nasciam também as primeiras comichões do amor ao pé do ouvido. Um grande dia, creiam! Um dia que, para mim, sempre foi Santo.
A mim, e a centenas de outros, São João iluminou esperanças, tornando-nos mais leves, menos egoístas, mais distantes dos “tijolos, do asfalto e do concreto” -- e mais próximos do alimento da alma e do bem-querer.
As brincadeiras nos dias de João revelavam algo sagrado: o exercício do amor em sua plenitude. Éramos felizes, invadidos pela pureza de sermos a criança que ainda habitava com carinho o cofre de nossa imaginação. Mas que pena que tudo isso passou tão depressa! E pior: a modernidade levou embora o brilho dessa festa.
Hoje, São João é triste. As fogueiras foram proibidas. Os balões, criminalizados. As quadrilhas se tornaram apresentações de palco, sem a espontaneidade de outrora. Nas ruas de nossa cidade, não se ouve mais o som da sanfona arrastando multidões para o terreiro.
Os arraiais minguaram. O milho virou produto de supermercado e os vestidos de chita deram lugar às fantasias industrializadas. Perdemos o cheiro de fumaça, o calor das mãos dadas, o frio gostoso das noites juninas aquecido pela música e pela fé. Tudo parece mais artificial, menos humano.
Que pena! Este 24 de junho, antes festivo, hoje se mostra ainda mais melancólico, com modernidade que insiste em apagar a tradição em nome do progresso.
Mas tenho fé: no próximo ano, talvez, se resgatarmos nossa memória afetiva, possamos, eu, você e todos nós, redescobrirmos o encanto da simplicidade e voltar a dançar quadrilha com o coração. Devorar os quitutes com gosto. Cantar e bailar como antes, ao som da sanfona do eterno Gonzagão:
“Tem tanta fogueira, tem tanto balão,
Tem tanta brincadeira,
Todo mundo no terreiro fazendo adivinhação...
Meu São João, eu não...
Meu São João, eu não tenho alegria,
Só porque não vem, só porque não vem, quem tanto eu queria...”
E então, dançaremos, brincaremos e nos amaremos até o amanhecer, para reaver a alegria do passado, que deve sempre renascer do amor que bate no peito de cada um de nós.
E, de peito aberto e esperança viva, poderemos gritar de novo:
Viva São João! Viva São João!
Amém!