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porto velho, quarta-feira 27 de novembro de 2024
As crianças e os adolescentes não estão imunes ao novo coronavírus, mas não estão entre os mais atingidos. Quando infectados, costumam desenvolver uma forma mais leve da Covid-19 e têm menos complicações do que os adultos. Porém, em alguns casos, podem precisar de cuidados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI).
Com a retomada de aulas em alguns municípios e a manutenção do isolamento em outros, o G1 reuniu 10 tópicos sobre o coronavírus em crianças, seus sintomas, como se proteger e como voltar à rotina em segurança:
Não. Ao contrário do que afirmou o prefeito do Rio de Janeiro, as crianças também são afetadas. Entre todas as hospitalizações por coronavírus no Brasil, ao menos 0,6% são bebês com menos de um ano. Crianças de 1 a 5 anos representam 0,5% dos casos mais graves e a faixa de 6 a 19 anos, 1%.
A gravidade da doença é que parece ser menor nos mais pequenos do que em outras faixas. Uma pesquisa divulgada pela revista médica "Lancet" analisou que menos de 0,1% das crianças infectadas evoluíram para casos mais graves.
Foram avaliadas 7.780 pacientes com Covid-19 em 26 países (EUA, China e países europeus). Embora 59,1% das crianças e adolescentes analisados tivessem apresentado febre e 55,9%, tosse, 19,3% deles eram assintomáticos. Apenas 0,14% desenvolveram a síndrome inflamatória multissistêmica, a complicação da Covid-19 que atinge as crianças. Sete morreram.
Pacientes com problemas de imunidade, doenças respiratórias e cardíacas compuseram o maior grupo das crianças afetadas e 5,6% tiveram outras infecções associadas.
De forma geral, as crianças costumam ser assintomáticas ou apresentar apenas sintomas leves como um quadro gripal, com tosse, coriza e febre (que acontece em cerca de metade dos casos).
Porém, as crianças podem ter sintomas um pouco mais graves como desconforto respiratório e falta de ar.
“Outra manifestação são os sintomas gastrointestinais, que precedem o quadro respiratório. Parte das crianças tem vômito, diarreia e dor abdominal”, afirma o coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia, Marcelo Otsuka.
O pediatra Victor Nudelman, da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, afirma que apenas 8% das crianças precisam de internação e apenas metade delas chega a necessitar de uma UTI.
Crianças têm maior riscos para quadros mais graves se tiver doenças pré-existentes como: câncer, algum problema hematológico, anemia falciforme, diabetes, obesidade, cardiopatias congênitas, doença renal crônica, asma, com algum tipo de imunodeficiência.
Aquelas que possuem alguma cromossomopatia, como Síndrome de Down, também têm predisposição para infecções graves. “Muitas vezes as crianças com Síndrome de Down podem ter um déficit imunológico ou doenças cardíacas, o que complica o quadro”, afirma o infectologista Marcelo Otsuka.
Com relação à asma, Nudelman esclarece que pacientes que têm a asma bem controlada, que não têm crises com frequência, passam a ter os mesmos riscos de crianças sem nenhuma comorbidade.
Os especialistas ainda não sabem explicar qual criança vai necessariamente desenvolver as formas mais graves da Covid-19. Porém, eles já observaram que pacientes que estão com outros vírus, como o da influenza, ou infeções nas vias respiratórias provocadas pela bactéria Mycoplasma têm mais tendência de ir para UTI.
Ainda não se sabe exatamente a causa, mas algumas crianças infectadas pelo Sars-Cov-2 desenvolvem sintomas de uma síndrome inflamatória multissistêmica, que pode exigir tratamentos intensivos e até levar a morte. Há casos registrados nos EUA, França e Reino Unido.
A infecção pelo Sars-Cov-2 desencadeia uma resposta imunológica do corpo com febre persistente (por mais de 3 dias), vômito, diarreia, lesões de pele, conjuntivite e sintomas cardiovasculares.
Os pais devem ficar alerta porque os sintomas podem aparecer de 3 a 5 semanas após o contato com o novo coronavírus mesmo que a criança não tenha apresentando sintomas da Covid-19.
“[A síndrome] Às vezes, é posterior a uma infeção sem sintoma. Um primeiro diagnóstico não faz pelo PCR. O paciente apresenta PCR negativo, mas tem sorologia positiva, o que mostra que teve contato pregresso com o vírus”, explica Marcelo Otsuka.
Alguns sintomas são muito semelhantes aos da síndrome de Kawasaki, doença que atinge normalmente crianças de até 3 anos. Nos casos relacionados ao coronavírus, a média de idade é superior: gira em torno de 8 e 9 anos.
A inflamação nas artérias é semelhante à provocada pela síndrome de Kawasaki, que costuma afetar artérias grandes e médias. No caso da inflamação provocada após o contato com o coronavírus, ela atinge mais os músculos do que as artérias do coração, de acordo com o pediatra Victor Nudelman.
A síndrome inflamatória aguda grave também pode apresentar sintomas da síndrome do choque tóxico, doença rara que pode gerar insuficiência renal aguda, ou da síndrome de ativação macrofágica, que atinge fígado e a medula óssea.
Um estudo britânico analisou pacientes com síndrome inflamatória multissistêmica do Great Ormond Street Hospital for Children, em Londres (Inglaterra). Dos 27 pacientes, quatro apresentaram sintomas neurológicos, como dores de cabeça, fraqueza muscular e reflexos reduzidos. Com o passar do tempo, os quatro tiveram melhora das condições neurológicas e dois se curaram completamente até o fim do estudo.
Não existe um exame único que indique a síndrome inflamatória multissistêmica, mas uma vez diagnosticada ela é tratada com injeções de imunoglobolina e de corticoide.
Sim. Apesar de, em geral, serem assintomáticas e não desenvolverem as formas graves da doença, crianças transmitem o vírus.
“Indivíduos assintomáticos muito provavelmente transmitem menos, mas transmitem. Se criança vai ficar com os avós ou ter contato com pessoas do grupo de risco, como obesos, hipertensos, é preciso ficar atento”, reforça Marcelo Otsuka.
Os pais devem manter todas as vacinas dos filhos, como a da gripe e a do sarampo, em dia. “Nossa cobertura vacinal caiu pela metade e essa deficiência nós vamos ver o reflexo logo, logo”, afirma Marcelo Otsuka.
O médico alerta que infecções associadas à Covid-19 podem contribuir para o agravamento do quadro clínico do paciente.
Com a reabertura e uma futura volta às aulas outros agentes infecciosos vão voltar a circular como sarampo, pneumococos e gripe. “Na hora em que retomarem as atividades isso vai explodir”, diz o médico.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) não recomenda máscaras em crianças menores de 2 anos, porque elas não conseguem usar adequadamente. Cabe aos pais avaliarem caso a caso e orientarem o uso correto desta proteção.
Um dos aspectos a se levar em consideração é que crianças menores costumam ter mais coriza e excesso de baba. Isso pode fazer com que a máscara fique úmida muito rápido, prejudicando a sua eficácia. Além disso, os pequenos têm dificuldade em controlar a necessidade de colocar a mão no rosto.
“Já vi criança com menos de dois anos que utilizava direitinho e outras, mais velhas, que não sabiam. Toda hora manipulavam” – Marcelo Otsuka, pediatra.
As máscaras devem ter tamanho adaptado para as crianças de maneira que cubram o nariz e o queixo, além ficarem bem ajustadas às bochechas.
Se os pais identificarem os sintomas da Covid-19, é aconselhável buscar orientação médica, mas não precisa necessariamente levar a criança ao hospital. Se estiver disposta e não tiver falta de ar, o médico pode orientar via teleconsulta, mesmo.
O médico vai poder indicar o momento de ir para o hospital para checar, por exemplo, a oxigenação sanguínea, um parâmetro muito importante. A medição é feita com um oxímetro – equipamento colocado na ponta do dedo do paciente (não precisa tirar sangue).
O pediatra Victor Nudelman alerta que a quarentena prolongada tem provocado reflexos psicossomáticos principalmente nas crianças maiores e nos adolescentes.
“Eles estão tendo que lidar com uma situação de perda. Ninguém está dando uma luz no fim túnel muito clara. Eles se perguntam como a gente vai viver até aparecer a vacina”, diz o médico.
Nem sempre eles têm filtro para a avalanche de informações que recebem e criam uma imagem de que são muito frágeis, ainda que os pacientes desta faixa etária se recuperem muito bem.
“Quando recebem o diagnóstico de Covid-19, alguns se desesperam", observa o médico. "Logo vão sentir falta de ar e que coração está batendo muito rápido. Muitos sintomas são mais psicossomáticos do que provocados pela própria doença."
No momento em que se discute a volta às aulas, certos cuidados devem ser levados em consideração. Convivemos ainda em um contexto de subnotificação elevada por falta de testagem em massa e não temos a real dimensão desta epidemia.
As situações devem ser analisadas caso a caso, lembrando sempre que crianças com qualquer sintoma não deve sair de casa.
Nudelman diz que alguns pais têm relatado que escolas ensaiam a reabertura de salas de aula com 35% dos alunos.
“Eu oriento que, em um primeiro momento, os pais evitem mandar as crianças que tenham alguma comorbidade, como obesidade, problemas pulmonares crônicos ou algum episódio de inflamação grave ao longo da vida”.
Outro ponto importante é saber com quais grupos de risco essa criança vai ter contato.
“É diferente a criança que vai para escola e volta para casa de outra que vai ter contato com obesos, hipertensos, ou que vai ficar com os avós”, observa Otsuka ao citar casos em que ele não recomenda a retomada das aulas presenciais.
As escolas devem tomar medidas para que as crianças mantenham distância.
Na Europa, as instituições de ensino estabeleceram horários diferentes para entrada, saída e intervalo para evitarem aglomerações. O controle de temperatura também costuma ser feito na entrada da escola em alguns países, como China.
“Como a escola vai conseguir manter as crianças distantes? Como vai ser o intervalo? E na hora da alimentação? As merendeiras estão sendo orientadas sobre quais os cuidados que devem ter? A escola vai conseguir manter todas as crianças de máscara?”, orienta Otsuka aos pais questionar.
As escolas também devem manter ambientes arejados, reforçar as regras de higiene do imóvel, além de fornecer álcool em gel e estimular as crianças a lavarem as mãos com frequência.
“O ideal é que a escola faça toda a programação de cuidados, como o distanciamento, álcool gel e, se possível, fazer testagem para saber qual é a prevalência da doença nesse grupo após um tempo de convívio”, afirma Nudelman.