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    porto velho, domingo 1 de junho de 2025

Ministra, Mulher e... sempre “rifada”?


Por Walterlina Brasil

30/05/2025 17:25:24 - Atualizado

A política nacional – e até mundial – eivada de masculinidades tóxicas e beirando ao descalabro de tantas insanidades, se superaram na falta de decoro, bom senso e urbanidade. No dia 27 de maio de 2025 a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, foi alvo de ataques e declarações ofensivas durante uma audiência pública na Comissão de Infraestrutura do Senado. O episódio gerou grande repercussão política e manifestações de apoio à ministra.

Durante a sessão, um senador do PSDB-AM afirmou que "respeita a mulher, mas não respeita a ministra", o que levou Marina a exigir um pedido de desculpas. Como o senador se recusou a se retratar, ela decidiu deixar a audiência imediatamente. Além disso, o presidente da comissão, do PL-RO, cortou o microfone da ministra e disse que ela deveria "se colocar em seu lugar", o que foi interpretado como um ataque machista. E foi. Mas as narrativas se emaranham, as mídias criam e disputam verdades, gerando agora o negacionismo científico socioambiental. E está todo mundo louco, achando que não estão no hospício da impaciência democrática.

A audiência.

Durante a audiência pública na Comissão de Infraestrutura do Senado, Marina Silva foi alvo de declarações ofensivas por parte de senadores da oposição. Um parlamentar do PSDB-AM afirmou que "respeita a mulher, mas não respeita a ministra", um comentário que rapidamente gerou indignação. O presidente da comissão, do PL-RO, interrompeu Marina ao cortar seu microfone e afirmou que ela deveria "se colocar em seu lugar", uma atitude amplamente interpretada como machista. Além disso, senadores ligados à flexibilização das normas ambientais acusaram a ministra de evitar um debate técnico e de dificultar projetos como o Licenciamento Ambiental.

Diante desses ataques, Marina Silva exigiu um pedido de desculpas pelo comentário do senador, mas, ao perceber a recusa, optou por se retirar da sessão imediatamente. Sua saída foi vista como um ato de protesto contra a falta de respeito no debate e contra a hostilidade sistemática enfrentada por mulheres na política. A decisão gerou reações distintas: opositores alegaram que sua retirada foi uma estratégia para fugir de questionamentos, enquanto aliados destacaram a necessidade de combater discursos desqualificadores e misóginos.

O episódio teve ampla repercussão política. Diversas lideranças se manifestaram em solidariedade à ministra, destacando o padrão de ataques sofridos por mulheres no poder. O presidente da República se pronunciou, defendendo a atitude de Marina Silva ao se retirar da audiência, mas sem aprofundar o debate sobre o conteúdo ambiental que estava em discussão. Movimentos feministas e organizações sociais repudiaram a postura dos senadores, reforçando a necessidade de enfrentamento à misoginia institucional. Ao mesmo tempo, grupos favoráveis à flexibilização ambiental – igualmente negacionistas da ciência socioambiental - reforçaram críticas à atuação da ministra, alegando que sua postura pode inviabilizar investimentos estratégicos na Amazônia.

“Déjà vu” de 2008?

Os ataques à ministra não são um evento isolado. Há um padrão histórico de resistência às suas posições, como já ocorreu em 2008. Naquele ano, Dilma Rousseff e Marina Silva, embora ambas tenham ocupado o espaço político progressista, tiveram embates em momentos decisivos, como no episódio das hidrelétricas durante o governo do mesmo presidente atual, quando Marina era ministra do Meio Ambiente e Dilma comandava a Casa Civil. O embate girava em torno do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que incluía a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, como as usinas do Rio Madeira.

Marina Silva defendia um licenciamento ambiental rigoroso, alertando para os impactos socioambientais das obras. Já Dilma Rousseff, focada na expansão da infraestrutura energética, pressionava por uma flexibilização das exigências ambientais para viabilizar os projetos. O próprio presidente criticou publicamente a demora na concessão de licenças ambientais, atribuindo o atraso ao Ministério do Meio Ambiente. Fez mais, criou unidade paralela que pudesse “agilizar” o processo e conseguiu. Conseguiu também as mais altas tarifas de energia da região Norte, o maior desbarrancamento de áreas ribeirinhas da região, o aumento da frequência de alagamentos e secas, a perda de biodiversidade inestimável, e uma confusão na vida dos amazônidas. E não aprendeu nada com isso.

Esse desgaste culminou na saída de Marina Silva do governo em maio de 2008. Em sua carta de demissão, ela mencionou "crescentes resistências junto a setores importantes do governo e da sociedade". O episódio marcou uma ruptura entre Marina e o PT, levando-a a se afastar do partido e a disputar eleições presidenciais posteriormente.

“Déjà vu” de 2008? e o que acontecerá?

As diferenças entre Marina Silva e Dilma Rousseff na área de energia refletiam visões distintas sobre desenvolvimento e sustentabilidade da época. Aqui estão alguns pontos principais, vejamos:

Belo Monte e o impacto das grandes hidrelétricas: A construção de Belo Monte é um dos exemplos mais emblemáticos da tensão entre desenvolvimento e preservação ambiental no Brasil. Defendida por Dilma Rousseff como parte da expansão energética do país, a usina foi implementada sem atender plenamente às condicionantes ambientais. Como resultado, comunidades ribeirinhas foram deslocadas, a biodiversidade foi severamente afetada e surgiram conflitos socioambientais ainda sem solução adequada. Marina Silva, desde o início, alertou sobre os impactos, defendendo um licenciamento mais rigoroso. Seu posicionamento, porém, foi constantemente contestado por setores favoráveis à aceleração do projeto. E o que a história ensinou? (Pausa. Respire).

Licenciamento Ambiental: flexibilização ou proteção? O Projeto de Lei do Licenciamento Ambiental (PL 2.159/2021) propõe reduzir exigências para obras de médio impacto, facilitando a liberação de empreendimentos. Para Marina Silva, essa flexibilização compromete a capacidade do Estado de proteger biomas e comunidades afetadas. Seus críticos, por outro lado, defendem que o excesso de burocracia prejudica investimentos e desenvolvimento. O debate continua acirrado, principalmente diante da tentativa de criar novas áreas de conservação na Margem Equatorial, região de interesse para exploração de petróleo.

A transição energética no Brasil: entre o petróleo e as renováveis. Marina Silva tem reforçado a necessidade de investir na descarbonização da economia, promovendo fontes renováveis como solar, eólica e biomassa. Em contrapartida, setores ligados ao petróleo no Norte do país defendem a exploração na Margem Equatorial como oportunidade de crescimento econômico. O dilema entre expandir combustíveis fósseis e apostar em energias limpas coloca o Brasil em um momento decisivo de sua política ambiental, especialmente na preparação para a COP-30, que será sediada no Pará. Enquanto os discursos destacam sustentabilidade, a realidade socioeconômica da região (e do Estado-Sede) segue desafiadora. Mas os prédios e as ruas onde os “líderes” vão passar estão pintadas, limpas. Será que vão fazer algum “muro”?

O que aproxima Dilma e Marina: “O colo do papai”?

Um estudo sobre terrorismo parlamentar aponta que a extrema-direita tem reforçado discursos misóginos e ataques sistemáticos contra mulheres no poder. Isso se manifesta em episódios como o impeachment de Dilma Rousseff e os ataques recentes contra Marina Silva.

Uma breve análise crítica sobre a trajetória de Marina Silva e Dilma Rousseff em relação ao projeto político liderado pelo atual presidente. Mais do que uma escolha, a reinserção dessas mulheres no projeto político do presidente atual revela um sistema que torna quase impossível a construção de trajetórias independentes. A crítica aqui não é a elas, mas à estrutura que as força a buscar esse retorno. De fato, ambas tiveram momentos de ruptura e afastamento, mas acabaram retornando ao espaço político comandado por ele. Mesmo rifadas.

Sabemos – e não há como negar – que Dilma foi “agraciada” pelo seu esforço, e se tornou a primeira mulher presidente. Mas depois rifada no segundo mandato. O silêncio do atual presidente nunca foi questionado e o retorno dele à presidência, sempre um fato narrado pelo “carisma” e poder das massas polarizadas (mortadelas). Jamais, que ele, logo após ela ter sido rifada e mesmo ele saindo da prisão, entendeu que deveria sentar a mesa com os algozes. “Nada pessoal, somente negócios”. De brinde, a esquerda mais sofisticada (gourmet), produz intenso documentário do quanto Dilma foi, de fato, vítima de uma direita apinhada de masculinidade tóxica. Enquanto nenhuma linha admite que Marina acertou no seu “excesso de zelo” em 2008. Se a trajetória de Dilma foi documentada e reconhecida como um exemplo de violência política de gênero, por que Marina, que também enfrentou desafios semelhantes, não recebe o mesmo tratamento?

Marina tentou. Rifada o tempo todo. Mudando domicilio eleitoral, para ter voz no lugar onde tudo manda e coloniza a Amazônia. Mas, tudo nela é cruelmente calculado para ser esmagada como pessoa e deixar de existir: voz, roupa, postura, fé, capacidade técnica, apelo científico. Mas ainda assim, resistiu com a Rede Sustentabilidade (como tentou a Luíza no PSOL). Não está negando que as demandas são necessárias, mas precisam incorporar aprendizagens e isso exige paciência porque são decisões irreversíveis. Precisam dar certo.

Essas mulheres nos colocam frente a um espelho: Tanto Marina quanto Dilma construíram suas trajetórias dentro de um campo progressista que, historicamente, tem o PT como maior força e se apresentam de volta ‘ao colo do papai”. Mesmo com divergências, talvez tenham considerado que não havia outro caminho consolidado para avançar suas agendas políticas. Isso é potente: o contexto político partidário e o modelo político brasileiro representado a partir da (suposta) falta de alternativas viáveis, tornada verdade com a polarização.

Desde os anos 2000, o presidente atual se consolidou como um “líder incontestável” da esquerda brasileira (“papai tá-on”), dificultando a ascensão de projetos políticos independentes dentro desse espectro. É o eixo único de representação do campo progressista e as mulheres não conseguem se mover nesse campo. Eles mesmos destruíram Marina Silva em uma candidatura que seria viável, que em outros momentos tentou construir um projeto próprio. No contexto crú, pode ter concluído que estar no governo atual era a melhor forma de garantir avanços na pauta ambiental. Dilma, após o impeachment, teve um retorno mais discreto, mas manteve-se próxima ao partido e tem mais chamego “do papai”.

Neste episódio, o presidente atual prestou solidariedade a Marina Silva, dizendo que a ministra agiu corretamente ao se retirar da audiência. Mas o conteúdo se volta a periferia da agressão (a masculinidade tóxica no tratamento dispensado a Ministra), do que ao conteúdo que ela defendia, se dispondo, inclusive a debater os dados científicos.

E isso abre um debate interessante: até que ponto personalidades como Marina e Dilma têm liberdade para construir caminhos próprios, ou acabam inevitavelmente orbitando em torno de figuras como o presidente atual?

A honrosa postura de Marina.

Marina declarou que não se intimidou com os ataques e que continuará atuando com firmeza na defesa do meio ambiente e dos direitos sociais. Mas o dedo em riste é único e, no momento dos fatos, solitários. Eu precisei recuperar 2008 porque é necessário. A economista Hildete Pereira destacou que a política brasileira ainda é extremamente hostil às mulheres, com baixa representatividade feminina no Congresso e ataques sistemáticos a lideranças como Marina Silva. Ela lembra que Dilma Rousseff também foi alvo de violência política, especialmente durante o processo de impeachment.

Um artigo recente aponta que o sexismo segue estruturando o poder no Brasil, afetando mulheres de diferentes partidos e trajetórias políticas. Marina Silva foi atacada por senadores que tentaram desqualificá-la, algo que já aconteceu com outras mulheres na política. Por sua vez, o Fórum Nacional de Mulheres Trabalhadoras das Centrais Sindicais repudiou os ataques contra Marina Silva, classificando-os como violência de gênero e racial. A posse da nova ministra das Mulheres, Márcia Lopes, se transformou em um ato de apoio à ministra do Meio Ambiente, reforçando a necessidade de combater o machismo na política.

Mas tudo isso ainda não é o suficiente: Marina clamou pelo “povo”. Desmobilizado. Cansado de polarização. E indo para a direita e ter “paz”. A esquerda enfrenta um desafio na comunicação com parcelas da população que buscam estabilidade e menos embates públicos. O barulho é intenso, mas nem sempre traduzido em mobilização concreta. Também rifam seus iguais (progressistas). A direita disfarça o acolhimento, e vai passando o trator. Sociedades democráticas não resistem muito tempo a essa lógica.

Contexto local.

Nasci em Rondônia, conheço a área costeira do Amapá, e minha única tia octogenária vive em Manaus, cidade que vejo menos do que gostaria por causa de uma política aérea excludente que impõe percursos e preços proibitivos. Já viajei pela BR-319 e quase perdi meus pais em um acidente de ônibus numa estrada castigada pela chuva. Minha experiência pessoal não é apenas uma coleção de deslocamentos; ela revela, na prática, o impacto das decisões políticas sobre infraestrutura, mobilidade e conservação ambiental.

A criação do "Golfo do Cabo Norte" não pode ser decidida sem respaldo científico, assim como tantas outras intervenções na Amazônia. Marina Silva clamou pelo povo, mas encontrou uma sociedade desmobilizada e cansada da polarização. A esquerda grita, mas nem sempre se faz entender; a direita avança silenciosamente, impondo mudanças irreversíveis. O que sobra? Uma democracia impaciente, onde progressistas rifam seus iguais e a desinformação molda percepções.

Na Universidade, o silêncio institucional é revelador Vivemos as cheias, os movimentos contra a destruição do Madeira e a angústia de novas hidrelétricas. A Universidade poderia oferecer análises críticas sobre o impacto desses projetos desde 2008, mas permanece em espera. A ciência documenta, protesta, adapta-se à realidade—mas, no fim, seu legado às vezes se resume a ironias brutais, como cemitérios de peixes criados para compensar desastres ambientais causados pela própria política energética. Estão aí. Foi o melhor que os cientistas fizeram, nas circunstâncias dadas, chorando o assassinato de bilhões de peixes nas turbinas das hidrelétricas, ensinando-os a “subir escadas” e acabando com a piracema.

E por que será? Eu não tenho a resposta para o silêncio. Do ponto de vista da esquerda centrista da UNIR, esmagar uma mulher, mais do que seus atos já deu consequências tristes para gestão. Então ficam de molho. Mas, no campo da gestão, se a Universidade perde sua capacidade de questionamento, o que resta de sua essência? O pragmatismo técnico pode até justificar decisões governamentais, mas não pode substituir a necessidade de refletir sobre os impactos socioambientais de longo prazo. Um silencio que distancia cada vez mais a Universidade de seu propósito e rifa sua pertinência científica.

Ataques no Senado: Marina abandona audiência — ofensa ou "calor do debate"? https://www.polemicaparaiba.com.br/polemicas/marina-abandona-audiencia-climao-no-senado/?

Marina Silva e Belo Monte. (2023) https://veja.abril.com.br/poli...

Hildete Pereira (Entrevista, 2025) https://oglobo.globo.com/blogs...

Nota do Fórum das Mulheres das Centrais (2025) https://csb.org.br/opiniao/mul...

Posse de Márcia Lopes (2025).

https://www.correiobraziliense...

Terrorismo Parlamentar da Extrema Direita (Neiva Lopes, 2025). https://revistaforum.com.br/op...


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