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porto velho, segunda-feira 25 de novembro de 2024
Brasília - DF - O Supremo Tribunal tem jurisprudência consolidada no sentido de não caber Habeas Corpus contra ato de ministro no exercício da atividade judicante, incidindo, por analogia, a Súmula 606 do STF.
Com esse entendimento, o Plenário virtual do Supremo não conheceu de cinco HCs impetrados tendo como autoridade coautora o ministro Alexandre de Moraes, relator do Inquérito 4.784, que investiga o uso de fake news contra integrantes da Corte. Dentre os pedidos está o trancamento do inquérito.
A decisão foi tomada por maioria e reafirma a jurisprudência do Supremo, que recentemente foi abalada em outro julgamento virtual. Foi admitido o HC 130.620, impetrado contra decisão monocrática da ministra Cármen Lúcia, que havia negado um agravo regimental. O pedido, no entanto, foi negado, mas a postura, elogiada por advogados.
Na ocasião, a maioria seguiu o voto do relator, ministro Marco Aurélio, por conhecer do HC contra ato de ministro. Desta vez, o vice-decano foi o único a votar vencido. Para ele, as exigências ao cabimento da impetração dizem respeito à causa de pedir e à existência de órgão acima daquele que praticou o ato.
“Inegavelmente, há, acima de cada qual dos integrantes do Supremo, bem assim dos Órgãos fracionários, o próprio Plenário”, afirmou o ministro. Outros oito integrantes seguiram o voto do relator deste HC, ministro Luiz Edson Fachin, que reforçou a jurisprudência da corte. O ministro Alexandre de Moraes não votou por estar impedido.
“A utilização do Habeas Corpus como alternativa ao recurso previsto na legislação, para atacar ato jurisdicional de integrante do Supremo Tribunal Federal, pode implicar desnível no quórum regimentalmente previsto para a solução da controvérsia versada no recurso, já que o prolator do ato atacado, quando incluído na condição de autoridade coatora, não participaria do julgamento do writ”, disse o relator.
Jurisprudência fixa
Embora o voto do ministro Luiz Edson Fachin tenha sido acompanhado por larga maioria, o entendimento não é hegemônico. O ministro Ricardo Lewandowski, por exemplo, acompanhou o relator, mas ressalvou sua posição “no sentido do cabimento do Habeas Corpus contra ato manifestamente ilegal”.
Ao votar, o ministro Celso de Mello procurou esclarecer o procedente recente em que se conheceu de HC contra ato da ministra Carmen Lúcia. Segundo explicou, os ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux votaram com a ressalva da inadmissibilidade do HC contra ato proferido por ministro do Supremo Tribunal Federal.
Já os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli acompanharam o relator “apenas e tão somente quanto ao indeferimento do pedido”, registrando que eventual mudança de jurisprudência pela Corte seja apreciada em sessão presencial de julgamento a ser oportunamente realizada. Neste momento, o STF só julga virtualmente ou por videoconferência, por conta da pandemia.
“Vê-se, desse modo , que o precedente que venho de referir não significou a superação da diretriz jurisprudencial firmada — e reafirmada — pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que se pronuncia no sentido da incognoscibilidade do Habeas Corpus, quando impetrado , como no caso , contra atos praticados por Ministros desta Suprema Corte”, afirmou o ministro Celso de Mello.
A mudança de posicionamento neste caso específico já havia sido descartada na ocasião pelo ministro Alexandre de Moraes.
Idas e vindas
De fato, o Plenário não teve a oportunidade de aprofundar presencialmente a discussão sobre HC contra ato de ministro. Há anos o tema gera divergência no tribunal e a corte teve pontos de inflexão, como mostrou reportagem da ConJur.
Em agosto de 2015, assentou que HC é "ação nobre sem qualquer limitação na Constituição Federal" em julgamento que terminou em empate de cinco a cinco. Por consequência, beneficiou o réu. O caso tratava da delação premiada do doleiro Alberto Youssef.
Menos de seis meses depois, por seis a cinco, o STF voltou ao posicionamento anterior sobre a questão, e tornou a não admitir HC contra decisão monocrática de ministro da corte. Para especialistas, as idas e vindas afetam a segurança jurídica e passam um mau exemplo aos magistrados de instâncias inferiores.
Já em 2018, a Corte teve novamente a chance de se manifestar em Plenário sobre o tema, em caso que discutia prisão domiciliar a Paulo Maluf. No entanto, a análise ficou prejudicada quando Fachin preferiu conceder HC de ofício para manter a domiciliar por questões humanitárias.
Na ocasião, Toffoli e o ministro Gilmar Mendes se posicionaram a favor do cabimento de HC contra atos de ministros da corte. Gilmar Mendes afirmou, à época, que a corte precisava discutir logo essa matéria. Ele falou que sempre foi a favor do cabimento do HC nesses casos, principalmente pelo o que chamou "uso exorbitante e excessivo" dos poderes monocráticos. "Estado de direito não comporta soberanos", declarou.
MS 36.422
O inquérito das fake news também foi analisado pelo Plenário virtual em mandado de segurança impetrado pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) contra a Portaria 69/2019, do Gabinete da Presidência do Supremo Tribunal Federal, a qual determinou a instauração do Inquérito 4781.
A entidade alegou que a portaria ofende o sistema acusatório, uma vez que instaurou inquérito por determinação judicial, sem a supervisão do Ministério Público. O pedido, no entanto, não foi analisado porque, nos moldes do HC, não foi conhecido pela corte — vencido, igualmente, o ministro Marco Aurélio.
Relator, o ministro Luiz Edson Fachin explicou que o regime interno do STF determina que mandado de segurança seja concedido para proteger direito líquido e certo não amparado por Habeas Corpus quando a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder estiver sob a jurisdição do Tribunal.
"No entanto, o ato (ou ameaça) impugnado na presente ação mandamental não provém de órgão ou autoridade submetida à jurisdição do Tribunal, porquanto os órgãos fracionários desta Corte, e os Ministros, individualmente, nos limites de sua competência, atuam em nome do próprio Tribunal", afirmou.