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porto velho, terça-feira 26 de novembro de 2024
BRASIL: Impulsionada nos últimos dois anos no Brasil, a utilização de elementos gráficos na área jurídica para melhorar a comunicação pode oferecer alternativas a pontos problemáticos apontados por juízes federais em manifestações de advogados ao longo de um processo, as petições judiciais.
A avaliação do grupo de estudos VisuLaw, que reúne mais de cem profissionais entusiastas da aplicação da técnica chamada visual law, decorre das respostas, entre maio e novembro de 2020, de cerca de 150 juízes federais de forma anônima a um questionário para medir a aceitação dos elementos visuais.
O resultado mostra que reclamações sobre argumentação genérica e redação prolixa lideram a lista, mas questões ligadas à estética e à objetividade também têm destaque no levantamento.
Dos juízes participantes, 62% criticam o excesso de páginas e 44% o de transcrição de jurisprudência nas petições. A má formação da peça foi citada por 31% deles.
A petição ideal é apontada como a que apresenta redação objetiva, boa formatação e uma quantidade menor de páginas, soluções buscadas pela nova modalidade.
"A nova comunicação que está sendo proposta pelo visual law envolve também a objetividade nas petições, para que elas fiquem mais claras e compreensíveis aos magistrados", destaca o advogado e coordenador do grupo de estudos Bernardo de Azevedo e Souza, que é professor da pós-graduação na Universidade Feevale, de Novo Hamburgo (RS).
Além de receberem peças com uso do visual law, magistrados também têm recorrido a recursos visuais para facilitar a compreensão de termos jurídicos.
Juiz federal no Rio Grande do Norte e auxiliar da presidência do TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região), Marco Bruno Clementino conta que conheceu a modalidade em 2019 e começou a abordar o tema nas aulas como professor da UFRN e nos próprios trabalhos antes mesmo de receber elementos visuais em petições.
"Acabou interessando a advocacia também, mas não é tão frequente como gostaria", afirma ele, que destaca os elogios feitos por juízes à aplicação feita em memoriais –resumos entregues por advogados na véspera de julgamentos– pela AGU (Advocacia-Geral da União) na segunda instância no Recife.
Um mandado de citação e intimação de penhora feito em 2020 pela 6ª Vara Federal da Justiça Federal do RN, então sob coordenação do magistrado, se tornou um dos exemplos nacionais de aplicação do visual law no Brasil.
Com vários pictogramas, pequenos blocos de texto e um vídeo informativo acessado por QR code, Clementino orienta as pessoas que receberem o documento que indica bloqueio de bens.
"Fez o maior sucesso porque mostrava uma certa empatia em relação à pessoa e tentava tranquilizá-la", diz.
O uso do QR code, porém, é rejeitado por 39% dos magistrados que responderam ao estudo do VisuLaw, e o de vídeos por 35%.
Para os pesquisadores, isso pode ocorrer pelo receio em acessar ambientes externos na máquina e por representar um trabalho adicional para os juízes.
Clementino reforça o segundo ponto, explicando que, pelo fato de as petições serem acessadas pelo computador, o uso de links é mais fácil.
"O que temos percebido é que os magistrados gostam de elementos visuais em petição, mas o que não querem é ter trabalho", diz, citando ter ouvido um colega desembargador reclamar de um advogado que pediu a ele que instalasse um novo aplicativo no celular para assim ter acesso à peça enviada.
Luciane Corrêa Münch, professora de inovação e design organizacional do Poder Judiciário da Enfam (Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados) e corregedora da Justiça Federal da 4ª Região, diz que o recebimento de argumentações feitas em vídeo é comum.
"Acho muito interessante essa possibilidade, porque os advogados podem utilizar o vídeo para reforçar fatos ou argumentos que consideram relevantes", afirma, acrescentando que os elementos visuais também fazem parte da rotina da corregedoria.
A magistrada destaca que é preciso lembrar que a própria lei é um elemento visual, uma vez que é escrita, mas que as imagens passam a ser usadas como forma de melhorar a comunicação desses textos.
Dentre os juízes que responderam o estudo, 46% disseram já ter recebido petições com fluxogramas. Na outra ponta, o uso de pictogramas foi mencionado por apenas 5% dos magistrados –os pesquisadores atribuíram esse número mais baixo à falta de compreensão sobre o termo, menos conhecido do que a palavra ícone para se referir a essas figuras usadas com frequência por advogados.
Outros dados do estudo mostram que 77% dos magistrados concordam com a tese que os elementos visuais facilitam a análise das petições, desde que usados de forma moderada. Para 10% dos juízes, os recursos facilitam em todos os casos.
"No momento em que os profissionais da advocacia começam a abusar desses recursos, as petições podem ser mal vistas pelo magistrado. Tem que ter um tato e um cuidado em como manusear esses elementos", diz Souza.
Neste semestre, o questionário será enviado para magistrados estaduais. Já no segundo semestre, o grupo pretende realizar uma etapa qualitativa da pesquisa, com entrevistas aprofundadas com juízes federais e estaduais.
Para Clementino, a lógica é pensar de que forma o elemento visual utilizado no documento facilita a comunicação, seja com o magistrado ou com a população.
"Não é para deixar mais bonitinha a peça, mas na verdade transformar aquilo em mais acessível no limite do termo, ou seja, na facilidade de busca da informação e a pessoas que têm dificuldade com a linguagem do direito", diz ele, que acrescenta como desafio a padronização dessa linguagem visual para não gerar insegurança jurídica.
Münch reforça que o fundamental é que o texto seja claro, organizado e objetivo e que os recursos visuais sejam usados para auxiliar na compreensão dos fatos ou argumentos. "Acredito que o cuidado a ser tomado é o de utilizar tais recursos na medida de sua necessidade e adequação."