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porto velho, quarta-feira 27 de novembro de 2024
BRASÍLIA – DF - Cabe indenização por danos morais quando a intenção do ofensor é rebaixar a imagem das vítimas em seu âmbito de convívio, afetando de forma inconteste sua imagem e honra perante a comunidade.
Com esse entendimento, a 4ª Vara Cível da Comarca de São Paulo condenou a Igreja Evangélica Assembleia de Deus e um de seus pastores ao pagamento de indenização por danos morais a uma fiel difamada durante culto.
A mulher contou ter nascido em uma família evangélica e que sempre dedicou a maior parte de seu tempo à igreja, frequentando os cultos e lá criando seu círculo de amizades. Porém, atualmente, ela buscava novas experiências, ausentando-se de alguns cultos e, desta forma, alegou que passou a sofrer assédio de um pastor da igreja.
Durante um culto, esse pastor teria dito: "Vou falar aqui publicamente e não estou nem ai para as consequências, vamos parar todos na delegacia se quiser, mas vou falar. Irmão é aquele que coopera… E tem uma família que me deu vários problemas, que família infeliz. A filha é pior que a mãe talvez, é uma família tribulosa, se eles não aparecerem mais aqui na igreja, eu agradeço, é um favor que me faz… Família que só causa confusão! Adiantou ser crente mais de 50 anos e a filha é uma rebelde? Que tipo de casa é aquilo?… Posso nem chamar de lar. A filha com fotos sensuais no Facebook, tocar hino do Corinthians na entrada do noivo pode! Eu só fiz aquele casamento porque sou um homem de caráter, mas a minha vontade foi virar as costas e ir embora. Estou de saco cheio dessa família, pode nem ser chamada de família…"
Depois desse incidente, a mulher entrou com ação na justiça contra o pastor e a igreja. A Assembleia de Deus se defendeu sustentando que o nome da autora da ação não foi mencionado no culto, não havendo ofensa aos seus direitos. Já o pastor disse que a mulher profanou o sagrado, usando seu o exemplo para que os demais fiéis não venham a se desviar.
A juíza Camila Sani Pereira Quinzani pontou que, mesmo o pastor não mencionando explicitamente o nome da autora, há menção a fatos indicativos que possibilitavam a todos compreenderem a quem as ofensas eram dirigidas, tanto que a autora teve ciência dos fatos por meio de fiéis que, presentes ao culto, lhe informaram o ocorrido.
"O direito à liberdade de expressão e o suposto intuito do pastor de usar como exemplo a família 'desviada' dentro da comunidade religiosa não é irrestrito e encontra limites frente à honra e imagem da autora, direito constitucional igualmente garantido", destacou a magistrada.
Ela acrescentou que o pastor tinha consciência de seus atos, tanto que mencionou em seu culto não se importar com as consequências de seu posicionamento. Quinzani enfatizou ainda que sendo o Brasil um Estado Laico, não compete ao Poder Judiciário analisar as condutas da autora diante de qualquer que seja a religião invocada, afastando, assim, as questões levantadas pelo pastor em sua contestação, relacionadas à profanação do sagrado pela mulher.
Dessa forma, para a julgadora, as condutas caracterizam ato ilícito e não se encontram albergadas pelo direito de liberdade de expressão, e uma vez que o dano moral resulta da própria narrativa da autora, considerando toda a humilhação que o incidente lhe trouxe, ensejam o dever de indenizar.
Por fim, apontou que é certa a relação de subordinação entre o pastor e a Igreja Evangélica Assembleia de Deus de São Paulo, o que conduz à responsabilidade civil da igreja, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil. Como as funções compensatória (principal) e inibitória (secundária) devem atuar, a juíza estipulou a indenização do dano moral total em R$ 10 mil.