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Ultradireitista José Antonio Kast testa no domingo o peso do pinochetismo no Chile

Livro traça um retrato do clã de candidato do Partido Republicano, liderado por patriarca filiado ao partido de Hitler e ligado ao regime militar chileno.


g1

Publicada em: 18/12/2021 11:11:14 - Atualizado

MUNDO: Ancorado na família, o ultradireitista José Antonio Kast revive o espectro do nazismo e do pinochetismo em sua campanha para a Presidência do Chile. Na reta final da corrida eleitoral que elegerá neste domingo o sucessor de Sebastián Piñera, veio à tona o documento que comprova a filiação do pai, Michael Kast Schindele, ao Partido Nazista.

Simpatizante do ditador que comandou o país entre 1973 e 1990, o candidato da extrema direita professou insistentemente o lema de ordem, segurança e paz para combater o crime, o tráfico de drogas e o terrorismo. Seu mantra seduz parte da população, tendo em vista a disputa acirrada no segundo turno entre ele e o representante da esquerda, o deputado Gabriel Boric, que está ligeiramente à frente, segundo as pesquisas.

Kast consolida capital político numa base eleitoral obcecada pelo medo da desestabilização política e econômica no país. Como avaliou ao site o jornalista e escritor Javier Rebolledo, essa parcela do eleitorado encontra no discurso conservador e populista do candidato do Partido Republicano, soluções fáceis e rápidas, calcadas na coerção e na falta de liberdade dos cidadãos.

Rebolledo investigou a fundo as violações aos direitos humanos no Chile e dedicou ao clã Kast boa parte de seu livro “À sombra dos corvos”, que esmiúça o envolvimento dos civis no golpe e no regime militar. A leitura traça um panorama do passado nazista de Michael Kast, que migrou na década de 1950 para o município rural de Paine, na região metropolitana de Santiago, forjando falsos documentos da Cruz Vermelha, após participar da invasão da Rússia e de missões em Crimeia, Áustria e Itália.

Em Paine, ele e a mulher Olga criaram os dez filhos e estabeleceram-se como fabricantes de embutidos e donos do restaurante Bavária. O patriarca cultivou a imagem de empresário respeitado, católico e anticomunista, contrário à reforma agrária patrocinada pelos governos do país entre 1962 e 1973.

De acordo com a investigação de Rebolledo, quando os militares derrubaram o presidente Salvador Allende, Paine se transformou num reduto da repressão e extermínio de opositores do regime. Calcula-se que pelo menos 70 camponeses e trabalhadores foram torturados e assassinados na cidade e arredores. O número representa, segundo o livro, a maior quantidade de vítimas da ditadura, em nível nacional, em proporção à densidade populacional.

O patriarca Kast e família deram apoio à caçada dos supostos terroristas, implementada na delegacia da cidade. Dois de seus filhos – Miguel e Christian – são apontados como colaboradores da Dina, a temida polícia política de Pinochet. Testemunhas contaram que Christian levava refeições para os policiais em serviço e participou de interrogatórios de presos.

A ditadura e o clã se imiscuíram de forma simbiótica. Mentor do grupo de economistas conhecido como Chicago Boys, que formulou a política econômica liberal do regime, o primogênito Miguel Kast liderou a Oficina de Planejamento Nacional (Odeplan) e o Banco Central.

“Miguel aparece como assessor da Dina, mas é também considerado uma espécie de messias por boa parte da direita chilena. Este é o homem que transformou os dirigentes políticos, que eram conservadores em temas sociais e nas questões econômicas, em conservadores nos valores, mas liberais na economia”, atesta Rebolledo.

Em busca dos votos da direita moderada, o caçula José Antonio Kast, de 55 anos, tenta, como candidato, aparar arestas incômodas de seu passado familiar. Nega os crimes de Paine e refere-se ao pai como um soldado inocente, que foi arrastado, como os demais jovens alemães, para a Segunda Guerra. No entanto, o registro obtido pela agência Associated Press mostra que, aos 18 anos, ele também se alistou voluntariamente ao partido liderado por Hitler.

A conjunção entre nazismo e pinochetismo atua como atrativo para a base eleitoral cativa de Kast. “Pinochetistas têm em comum com os nazistas um anticomunismo declarado. Consideram que sempre a solução mais simples é destruir e torturar e podem chegar ao extermínio”, resume o escritor.

Por isso, no seu entender, há uma parte da população chilena que está “disposta a aceitar as soluções mentirosas” propagadas pelo candidato da extrema direita, votando no domingo em torno da segurança, do conservadorismo, do emprego, do crescimento econômico e da erradicação da delinquência. O confronto eleitoral deste domingo mede a dimensão do medo nos dois campos adversários do Chile.




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