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    porto velho, quarta-feira 22 de janeiro de 2025

Será o Programa Mais Professores a melhor solução para o BlackOut Docente?


Por Walterlina Brasil

21/01/2025 11:22:30 - Atualizado

Recentemente o Governo apresentou a implementação do “Programa Mais Professores”. A repercussão foi imediata e já tem gerado diversas discussões. Uma delas é quanto a sua natureza e eficiência e a outra são as comparações com o já estabelecido Programa Mais Médicos. Nesta coluna apresento algumas reflexões nos dois tópicos: a primeira sobre a repercussão do Mais Professores e, em seguida, vou dar alguma ênfase nas distinções entre os dois programas. Também proponho uma análise preliminar quanto aos desafios e críticas enfrentados pelo Mais Professores em âmbito local.

Repercussão do Programa Mais Professores.

Como é comum no Brasil, a proposta é uma daquelas coisas da política nacional que expressa o quanto a Democracia se esgota e a participação social passa a ser cosmética quanto as políticas de base. A repercussão, como tudo o que persiste hoje, está polarizada: uma ponta afirma que não se fez nada de concreto pela formação de professores no Brasil e “quando o governo faz, só criticam”. Outra ponta diz que com esmolas não se melhora a educação. Eu escrevo aqui: política pública se faz com estruturação de base e na base. Governos que centralizam políticas nacionais e as federalizam com essa profundidade, tendem a comissionar votos e impregnar o país de governos centralizadores. Um outro efeito colateral indesejável neste tipo de ambiente governamental é mais um Programa que, tornando-se permanente, corre o temerário risco de dependência social aos benefícios do Estado e retorno duvidoso (além do eleitoral, qual seria o outro?). Bom, a bolsa do Programa – que nem se compara com o valor do “Mais Médicos” - vem com bônus: você pode desde o início se endividar com as vantagens do seu cartão de crédito, mediante as vantagens para viagens, turismo e lazer. E por que será que isso “cola”?: na cultura nacional, sabemos que o presente está valendo mais do que confiar em estabilidade e equidade social a longo prazo. Simples assim.

A comparação entre Mais Professores VS Mais Médicos I

Uma repercussão propagada sobre o Programa Mais Professores é sua semelhança (ou experiencia similar que inspira o programa) em relação ao Mais Médicos. O Mais Programa Mais Médicos surge em 2013, por meio de Lei 12.871/2013 enquanto o Mais Professores surge em 2025, por meio de Decreto-Lei 12.871/2025. Já temos distinção processual e jurídica.

De imediato vamos lembrar que Lei e Decreto-Lei possuem diferenças. A primeira é proposta por membros do Legislativo (deputados, senadores) ou pelo Executivo (presidente, governadores) e tem várias etapas no legislativo para – se aprovada – ser sancionada pelo Chefe do Executivo (presidente, governador). O Decreto-Lei, por sua vez, é criado diretamente pelo chefe do Executivo (presidente). Ou seja, não passa pelo Legislativo inicialmente. É entendida como uma medida de caráter urgente e provisório, vigorando imediatamente após sua publicação, mas precisa ser aprovado pelo Legislativo em um prazo determinado (geralmente 60 dias) para se tornar uma lei definitiva. Em síntese, a Lei passa por um processo mais democrático e detalhado, enquanto o Decreto-Lei é utilizado em situações emergenciais onde a rapidez é crucial. Por sua vez, já saiu de imediato a regulamentação por meio da Portaria 6/2025 de 15 de janeiro, da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento e Política de Pessoal do Ensino Superior, do Ministério da Educação).

Porém, é importante indicar que, em resumo, o Mais Professores se apresenta como uma política de Estado, com foco na formação a longo prazo, enquanto o Mais Médicos caracterizou-se como uma política de governo, com foco no atendimento imediato a uma demanda específica. Essa distinção é fundamental para compreender as diferenças entre os programas e evita comparações simplistas que possam desvalorizar a carreira docente. O que torna o Mais Professores – como apresentada pelo Governo e seus confetes acríticos – ainda mais temerário.

A comparação entre Mais Professores VS Mais Médicos II

As semelhanças entre os dois programas, usados para demonstrar a viabilidade e um “case de sucesso” do Mais Médicos, se limitam a três coincidências. A primeira, o objetivo geral de suprir carências de profissionais no País. De fato, ambos os programas foram criados para enfrentar a escassez de profissionais em áreas essenciais para o desenvolvimento social: a educação, no caso do Mais Professores, e a saúde, no caso do Mais Médicos. A segunda, o fomento indireto a incentivos. Mas o fazem por mecanismos indiretos por incentivos financeiros – recursos do próprio governo – onde o Mais Professores oferece bolsas de estudo e incentivo docência, enquanto o Mais Médicos oferecia bolsas de estudo e ajuda de custo. A terceira, o foco para atrair atuação em regiões “com dificuldades”, ou seja, os dois programas, em seus textos originais ou em regulamentações posteriores, demonstram preocupação com a distribuição desigual de profissionais pelo território nacional, buscando incentivar a atuação em regiões com maior carência.

Mas suas distinções são esmagadoramente desfavoráveis ao Mais Professores. Podemos resumir com o fato de que o Mais Médicos buscar profissionais já formados, enquanto o Mais Professores foca em estudantes de licenciatura. Essa diferença fundamental impacta toda a estrutura e implementação dos programas e causa suspeição quanto aos investimentos em Programas importantes vigentes dentro das Universidades como o PIBID (Programa de Bolsas de Iniciação à Docência). O Mais Médicos prioriza o preenchimento imediato das vagas; o Mais professores condiciona a “regaste financeiro” ao atendimento (investimento a fundo perdido?) a pelos menos dois anos de serviço público não efetivo; não aceita profissionais do exterior e direciona ao público “mais carente”, embora encubra essa informação pelo escore do ENEM de 650 pontos. A bolsa do Mais Professores é uma poupança resgatável, após permanência na rede pública enquanto o mais médicos é durante o período de atuação e bem mais atraentes que a política salarial docente. Mais médicos não tem intermediários: bolsistas e Ministério da Saúde. Embora alinhado com a Política Nacional de Formação de Professores, o Mais Professores, define – na prática – os Programa de Pós-graduação profissionais em “secretarias executivas” das ações formativas, invadindo – de maneira indireta, mas “convincente” – a autonomia didática das Instituições de Ensino Superior que as detenham.

A comparação entre Mais Professores VS Mais Médicos III

A comparação entre o Programa Mais Professores e o Mais Médicos pode levar a interpretações equivocadas sobre a valorização da carreira docente. O Mais Médicos, criado em um contexto de urgência para suprir a falta de médicos, adotou medidas excepcionais, como a dispensa de revalidação de diplomas. Essa flexibilização, justificada pela necessidade imediata, não deve ser tomada como parâmetro para a valorização profissional. A formação de professores, por sua vez, requer um investimento a longo prazo, com ênfase na qualidade da educação e na formação continuada. Comparar as bolsas e incentivos do Mais Professores com os salários pagos aos médicos do Mais Médicos cria uma falsa equivalência, desconsiderando as diferentes naturezas dos programas e as especificidades da carreira docente. A argumentação de que o Mais Professores valoriza a carreira docente fica fragilizada quando comparada com as medidas emergenciais do Mais Médicos, podendo inclusive reforçar a percepção de desvalorização da docência.

O Mais Professores é ridículo.

O Decreto que institui o Mais Professores – popularizando o termo “pé-de-meia” utilizando para estudantes do ensino médio - na prática buscou justificar-se para dar atratitividade à carreira docente. De fato, há farta pesquisa sobre o tema que gerou a expressão popularizada como “blackout docente” e é um fenômeno mundial. Mas a proposta “à lá Brasileira” apresenta um texto onde propõe o que identificam como “ações integradas para a valorização e qualificação do magistério e o incentivo à docência no Brasil”. Realçando a importância dos professores na aprendizagem dos estudantes e os desafios enfrentados na carreira docente, apela, na verdade “ao senso comum” desses argumentos. No diagnóstico que apresentou ao público, reitera que apenas 3% dos estudantes de 15 anos querem ser professores; que as avaliações do ENADE estão abaixo de 50; a evasão atinge 49,2% dos cursos e que, dos formados, apenas 1/3 assume a profissão.

Para esta colunista, estes dados escondem algo tenebroso: Apesar da LDB (Lei Nacional que orienta a Educação: 9.394/1996) caminhar para os seus 30 anos em 2026, o mesmo diagnóstico informa que 33,3% das docências da Educação Básica não têm professores com formação adequada. E, na perspectiva regional, os “locais ermos” (leia-se onde estão os miseráveis e carentes de bens públicos), são o foco para “conquistar” o afeto daqueles que vão ter que cumprir pelo menos dois anos de profissão, entre os cinco anos de tolerância depois de formados, para acessar o pé-de-meia. Não é uma profissão, é um castigo.

Sim, claro, tem algo bom: por enquanto é somente para cursos presenciais.

Contexto Local.

Ah! De imediato, a Universidade Federal de Rondônia está fora. São elegíveis nesta primeira versão do Programa, apenas estudantes inscritos nos Editais via Sisu, ProUni e Fies. É o que interpreto a partir do Parágrafo primeiro, do Artigo 4º, na Portaria 6/2025 da CAPES (publicada em 15 de janeiro), que define as regras de prioridade. Além disso, os cursos de licenciatura, obrigatoriamente, terem a nota mínima de 4 no Conceito Preliminar de Curso (CPC). A UNIR não participa do SISu. (Sim, já sei! A solução: vamos correndo internamente deliberar porque agora o “governo quer”. Tudo bem, apesar de termos quase dez anos clamando essa conversa aberta). Do IFRO? Ainda não sei. Eles cuidam bem da vida deles, ao que parece.

Tem muitos vieses esse tema. Mas isso podemos ver na próxima coluna. Deixe seus comentários.

Fontes: Dá uma olhadinha?

Lei do Mais Professores: https://www.in.gov.br/en/web/d...

Portaria Capes: https://cad.capes.gov.br/ato-a...

Lei do Mais Médicos: https://www.planalto.gov.br/cc...

Que tal ver os comentários, no página “O ASSUNTO”: “RISCO DE APAGÃO..”

*NOTA: As opiniões nesta Coluna não expressam, necessariamente, o pensamento da Universidade Federal de Rondônia, nem dos diversos setores que a constituem.


Dra. Wal Brasil

*Professora Walterlina Brasil é Docente Titular do Departamento de Ciências da Educação da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Professora em Cursos de Licenciatura e do Programa Nacional do Mestrado Profissional em Administração Pública – PROFIAP UNIR. Pesquisadora do Grupo de Estudos de Educação Superior – GEPES/UNIR

Sobre mim: https://linktr.ee/walterlina.brasil



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