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    porto velho, segunda-feira 10 de fevereiro de 2025

Crônica - Viajar de avião, do glamour do passado ao caos aéreo do presente

Quem não se lembra do serviço de bordo de antigamente? era um banquete em pleno céu: taças de uísque douradas, garrafas de vinho que brilhavam como rubis e cervejas geladas...


Redação

Publicada em: 07/02/2025 19:04:36 - Atualizado

Foto: Rondonoticias


CRÔNICA DE FIM DE SEMANA - VIAJAR DE AVIÃO -  DO GLAMOUR DO PASSADO AO CAOS AÉREO DO PRESENTE

Arimar Souza de Sá

Viajar de avião no Brasil já foi, um dia, uma experiência luxuosa. Lembro-me de quando criança em Porto Velho, a expectativa de voar era um sonho, tinha um sabor doce, como o aroma de um perfume raro, que envolvia o passageiro com uma promessa de conforto e exclusividade em pleno ar.

Mas o que antes era um marco de sofisticação e prazer, com tarifas razoáveis e a gentileza de um atendimento cortês e prazeroso, hoje se transformou em um verdadeiro teste de paciência, resistência e desmoralização. E tudo isso, com o beneplácito da ANAC, que faz vistas grossas ao descalabro que se tornou o sistema aéreo brasileiro.

Quem não se lembra do serviço de bordo de antigamente? era um banquete em pleno céu: taças de uísque douradas, garrafas de vinho que brilhavam como rubis e cervejas geladas, que deslizavam pelas mãos das aeromoças com a suavidade de uma brisa no verão.

O jantar - Ave Maria! - era uma experiência digna de reis, com talheres refinados que dançavam no prato e cardápios de primeira, como se estivéssemos saboreando a própria essência do luxo. E isso, aqui pra nós, fazia a viagem em si, ser uma jornada encantadora, onde o tempo parecia se arrastar envolvido pela suavidade de um vinho que escorria do cálice, servido pelas lindas comissárias, enquanto o passarinho suavemente ia deslizando literalmente nas nuvens...

Mas o tempo cruel chegou, mandou a conta e carregou tudo isso e  alojou no silêncio da aviação. Hoje, as passagens, com preços que desafiam qualquer explicação lógica, são a primeira decepção. A alta temporada já é, por si só, um pesadelo de tarifas inflacionadas, mas o que dizer da baixa temporada, quando as tarifas continuam nas alturas? Uma verdadeira ironia, como se o céu não fosse mais azul, mas uma turbulência a dez mil pés de altitude.

Quem mora em regiões mais afastadas, como Rondônia, tem de fazer malabarismo financeiro para conseguir viajar ao sul do país. A disponibilidade de voos é escassa e o valor das passagens está sempre nas nuvens, como se o combustível usado na aeronave fosse extraído do ouro, o que sugere pensar que as companhias aéreas devem achar que o simples fato de ir ao sul seja um privilégio reservado a poucos e não ao povo de Rondônia.

Senão, vejamos: Ao adentrar o avião, o choque com a realidade é imediato. Os bancos, colados na poltrona da frente, forçam o corpo a se contorcer de maneira desconfortável para acessar a janela, como se a própria cadeira fosse uma armadilha de metal. E, se o corpo for de proporções maiores, a situação se agrava: a mesinha disposta na poltrona da frente se torna um obstáculo intransponível para quem precisar ir ao banheiro - fato que torna a refeição e o deslocamento uma batalha e a viagem um caos.

O serviço de bordo, esse "toque de classe" antigo da viagem aérea, virou uma piada sem graça. Uma garrafinha de água e um biscoito industrializado (goiabinha da Latam) não são exatamente o que se espera de um voo de médio ou longo curso, como por exemplo Porto Velho a São Paulo, deixando a impressão de que o céu já não é mais vasto, mas um teto sem brilho, onde os passageiros ficam presos nas mãos dos tripulantes desfrutando da pura indiferença.

E os aeroportos... Ah, os aeroportos... São como labirintos sem fim, onde o destino parece se distanciar cada vez mais à medida que você anda ou corre de um portão para o outro, quando recebe o chamado de um voo. Se o sujeito precisar de informações, 'tá lascado', os funcionários são grossos e atendem de má vontade e não dão a mínima para o passageiro.

Em Guarulhos, por exemplo, um simples quibe e um pão de queijo podem custar mais do que a passagem de ida e volta de um voo de curta distância. Cada mordida é como um golpe financeiro, uma lembrança de que o antigo paraíso foi trocado pelo desapreço no chamado salve-se quem tiver dinheiro.

Em meio a esse caos, o pior de tudo é o tratamento impessoal das companhias aéreas, que mais parecem se esquecer de que estão lidando com seres humanos. O desconforto é apenas uma parte da equação; o verdadeiro golpe é a sensação de que você não é mais um cliente, mas uma carga a ser transportada de qualquer jeito. A indiferença paira no ar como um nevoeiro denso, deixando os passageiros à deriva e sem ter a quem recorrer.

No final, voar, o que antes era um prazer, uma viagem esperada com alegria e até um certo glamour, virou uma aventura de pernas para o ar. Não daquelas que a gente escolhe, mas das que caem sobre nós por pura falta de opção, fazendo-nos crer que, a verdadeira viagem não é mais no avião, mas na paciência e na resistência do viajante.

AMÉM!

O autor é jornalista, advogado, e apresentador do Programa A VOZ DO POVO, da Rádio Caiari FM, 103,1.


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