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porto velho, segunda-feira 25 de novembro de 2024
Para conter a escalada da inflação nos Estados Unidos —que terminou o ano passado no maior nível dos últimos 40 anos, em meio a gargalos em cadeias produtivas, agravados pela pandemia—, o banco central norte-americano, o Federal Reserve (Fed), planeja começar no curto prazo um novo ciclo de alta na taxa de juros.
A autoridade monetária americana tem sinalizado que o primeiro aumento desde 2018 deverá ser anunciado na reunião de março, quando é esperado que também suspenda os estímulos financeiros que vem lançando na economia para fazer frente aos impactos da pandemia na atividade econômica.
Por se tratar da maior economia do mundo, uma mudança de direção na política monetária dos Estados Unidos reverbera em todos os cantos do globo. O Brasil não está de fora dessa lista.
Com taxas maiores de juros americanos, é esperada uma migração de parte do dólar que entra no Brasil, assim como em outros países, para os EUA. Com menos dólares no país, a moeda americana tende a se valorizar ante o real, pressionando a inflação local.
“Uma alta de juros nos Estados Unidos pode, em um primeiro momento, impactar o Brasil através do aumento da inflação”, diz Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos. Variações cambiais têm grande impacto no índice de preços no país, que depende de matéria-prima importada para produção dos mais variados itens.
Um exemplo disso são os preços dos combustíveis, grandes responsáveis pelo pico de inflação no ano passado, e cujos reajustes acompanham o preço internacional do petróleo, em valores recordes.
À medida que a inflação oficial terminou o ano passado muito acima do teto da meta — algo que não acontecia desde 2015, o cenário fica mais preocupante e levanta a questão: o Brasil está preparado para um novo período de aperto monetário nos Estados Unidos?
Totalmente ileso, é difícil que o Brasil saia dessa, mas economistas ouvidos pelo site avaliam que o Banco Central (BC) se antecipou em elevar a taxa Selic com uma maior intensidade e rapidez, o que faz com que o país possa encarar os aumentos nos juros nos EUA com maior tranquilidade, uma vez que o aperto monetário aqui acaba freando uma valorização ainda mais enérgica do dólar.
Para Sanchez, o Banco Central possui uma política monetária “potente” e que teve “sua relevância aumentada nos últimos anos”. O economista entende que “a elevação dos juros pelo BC é suficiente para controlar o avanço inflacionário e das expectativas de inflação”.
Outro ponto que pode amenizar a elevação dos juros nos EUA é a antecipação por parte do mercado. Ou seja, por ser um movimento esperado, ele já está “precificado”, no jargão do mercado, segundo a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack. “O que pode ocorrer é se o banco adotar uma postura mais agressiva do que a que ele já vem sinalizando”, afirmou.
A especialista também lembra que, no caso do mercado acionário,”mesmo com as sinalizações de aumento vindas do Fed, ainda continua existindo muito fluxo de investimento estrangeiro em renda variável no Brasil”. Na avaliação da economista, isso é um indicativo de que o país se demonstra como um mercado de confiança aos investidores.
Ainda que os juros em alta no Brasil tenham o poder de amenizar a valorização do dólar aqui, segundo especialistas, ainda não é suficiente para barrar os efeitos da moeda-norte americana mais fortalecida nos preços.
Segundo o economista da Eleven Financial Thomaz Sarquis, apesar de o país ter se mostrado mais cauteloso com sua saúde fiscal após a recessão de 2015-2016, ainda há riscos nesse setor. “Ainda temos contas em uma situação frágil e estamos longe das metas de inflação”, afirmou.
Para o economista, é preciso observar a taxa de câmbio e o preço das commodities. “O grande problema é que grande parte das commodities subiram consideravelmente de preço, isso acaba anulando o efeito do câmbio sobre a inflação no curto prazo”.
Sarquis coloca como um desafio ao país aprovar reformas que tenham como objetivo frear a trajetória de gastos, pois uma situação fiscal frágil expõe o país aos riscos externos. “Contudo, quaisquer pacotes e medidas em tramitação hoje são muito mais com uma óptica gastadora do que a óptica de poupar”.
O último período de alta de juros nos EUA ocorreu entre os anos de 2016 a 2019, quando o índice, que é trabalhado em intervalos, estava entre 2,25% e 2,50%. O economista Thomaz Sarquis comenta que, naquele momento, durante o governo do ex-presidente Donald Trump, uma das medidas mais famosas foram os cortes de impostos.
“Ao cortar impostos corporativos, ocorre um impulso de demanda agregada. Com isso, investimentos dispararam, a atividade econômica crescia muito, gerando uma contrapartida inflacionária, claro que nem perto do que vemos atualmente. Mas o Fed precisou compensar esse efeito muito forte que estava tendo na atividade econômica e elevou o juro”, explica Sarquis.
Outro fator que fez com que ocorresse o aumento foi a então guerra comercial entre os Estados Unidos e a China. O conflito tarifário fez com que a inflação norte-americana fosse elevada, resultando na necessidade de exercer essa política fiscal.
Grande parte dos analistas de mercado espera que a taxa de juro nos EUA tenha quatro altas em 2022, indo da faixa atual de 0% e 0,25% ao ano para 1,25 a 1,5%, e com novas altas previstas para 2023. A nova reunião do banco central norte-americano está prevista para ser realizada em março.