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porto velho, quarta-feira 16 de julho de 2025
RONDÔNIA - Em cenário de crescente preocupação com a vulnerabilidade dos consumidores em operações financeiras, especialmente aposentados e pensionistas do Instituto Nacional Seguro Social (INSS), o Ministério Público Federal (MPF) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) têm consolidado parceria estratégica para combater fraudes e aperfeiçoar a segurança nos empréstimos consignados.
Encontro entre as instituições, realizado na última quinta-feira (10), teve como foco incentivar o aprimoramento de normas e da autorregulação, visando fortalecer a comprovação de consentimento e reduzir a vulnerabilidade a golpes.
A iniciativa do MPF surge a partir do aumento nas denúncias que envolvem contratações não autorizadas e descontos indevidos de empréstimos consignados. Este panorama levou o MPF a instaurar um procedimento administrativo para apurar as irregularidades e fortalecer os mecanismos de proteção aos consumidores, em particular os beneficiários do INSS, que são frequentemente as principais vítimas.
Durante a reunião, o procurador da República Hilton Melo enfatizou a gravidade da situação, destacando o aumento no número de representações de cidadãos vítimas de crimes financeiros. Ele ressaltou que o tema está sendo tratado com alta prioridade dentro do Ministério Público, que não apenas investiga as fraudes já existentes, mas também busca proativamente formas de aprimorar a contratação e a transparência em todo o sistema de empréstimos consignados.
Medidas protetivas e corretivas - Nesse contexto, a Febraban apresentou medidas preventivas e corretivas adotadas pelo setor bancário, com um foco especial na autorregulação iniciada em 2020. O diretor-executivo da Federação, Amaury Oliva, apontou que essa autorregulação já conta com a adesão de 71 instituições financeiras, cobrindo 99% do mercado de crédito consignado. Essas instituições estão sujeitas a auditorias externas anuais, que se estendem aos 150 maiores correspondentes bancários, buscando garantir um controle rigoroso e contínuo.
Entre as principais ações implementadas, destaca-se a obrigatoriedade da biometria facial, uma medida crucial para a autenticação. É importante salientar que, desde novembro de 2022, a biometria facial tornou-se um requisito obrigatório nas contratações realizadas por correspondentes, em conformidade com a Instrução Normativa INSS nº 138/2022.
De forma complementar, o INSS passou a exigir o desbloqueio biométrico prévio dos beneficiários para qualquer nova operação, o que adiciona uma camada extra de segurança. Este desbloqueio, conforme explicado pelos representantes da Febraban, conta com checagem de biometria facial cruzada com os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), embora seja reconhecido que nem todos os cidadãos possuem esse cadastro. Para superar essa lacuna, alternativas como o reconhecimento facial por verificação entre documentos e a imagem capturada no momento da contratação foram implementadas.
Além da biometria, o setor bancário tem incorporado outras tecnologias para aumentar a segurança das operações. “As contratações agora contam com recursos como geolocalização, reconhecimento de imagem e detecção de inconsistências documentais em tempo real, o que significa que há uma verificação mais robusta e imediata da validade e da autenticidade de cada transação, tornando o ambiente muito mais seguro para o consumidor”, destacou Amaury Oliva.
Resultados - Segundo a Febraban, houve queda de 79% nas reclamações registradas no portal consumidor.gov entre 2021 e 2024. Adicionalmente, houve redução das fraudes por falhas de autenticação de 0,74% em 2019, para 0,03% em 2024. Além disso, já foram aplicadas mais de 1.500 sanções a correspondentes que não cumpriram as normas, e mais de 5,3 milhões de consumidores se inscreveram no serviço “Não Me Perturbe”, ferramenta crucial para coibir a oferta indesejada de crédito consignado.
Apesar dos avanços, o MPF, por meio dos procuradores da República Hilton Melo, Alfredo Falcão e Cláudio Gheventer, reiterou dois pontos prioritários para fortalecer ainda mais a proteção ao consumidor. Em primeiro lugar, exigiu a entrega imediata, ao consumidor, de todos os elementos comprobatórios da operação, incluindo cópia do contrato, biometria, geolocalização, logs e demais metadados. A medida é fundamental para fins de defesa administrativa e judicial, garantindo transparência total e acesso à informação.
O procurador Hilton Melo chamou a atenção para falhas concretas de grandes bancos no fornecimento das informações, como a inoperância de canais de WhatsApp para esse fim, ressaltando a urgência de canais adequados de atendimento para consumidores que desejem acesso a cópias de contratos e dados relacionados à contratação, especialmente diante de suspeitas de fraudes.
O segundo ponto prioritário é a implementação da vídeoverificação. Esta consiste na gravação de imagem e diálogo, atuando como uma camada adicional de consentimento informado e prevenção a fraudes sofisticadas. Essa proposta está em consonância com práticas internacionais, como as adotadas pelo Conselho de Segurança da União Europeia, onde contratos sensíveis exigem múltiplas camadas de autenticação, inclusive presencial ou por videoconferência. O procurador Alfredo Falcão enfatizou que o modelo de videoverificação deve ser incorporado como “requisito mínimo, e não apenas como opção tecnológica", dada a sua capacidade de proteger contra a criação de identidades falsas e contas fraudulentas.
A Febraban acolheu essa demanda e informou que já está em fase de testes com resultados promissores. A expectativa é de que haja um potencial de expansão para até 90% dos correspondentes associados. Segundo esclarecimentos dos representantes da Febraban, a videoverificação já implementada de forma piloto por algumas instituições consiste em uma entrevista com o consumidor, conduzida por um atendente humano ou por uma interface digital (inteligência artificial), para a validação da autenticidade da operação.
O procurador Hilton Melo reiterou a necessidade urgente de se estabelecer um cronograma de universalização da videochamada como etapa obrigatória da jornada de contratação. Ele salientou que a videochamada, quando bem estruturada, é uma entrevista conduzida por um terceiro contratado, na qual são coletadas declarações explícitas sobre o entendimento e aceitação das condições do contrato, garantindo assim a autenticidade das operações.
Encaminhamentos - A cooperação interinstitucional resultou em encaminhamentos, incluindo o compromisso da Febraban de enviar ao Ministério Público Federal a apresentação técnica utilizada na reunião, detalhando as medidas de segurança adotadas pelas instituições financeiras, com foco em videochamadas e biometria facial. Além disso, a Febraban deverá mapear e compartilhar o estágio atual da implementação da tecnologia de videochamada entre os bancos de diferentes portes e seus correspondentes, apresentando também um cronograma para a ampla adoção e uniformização desses procedimentos até 2026.