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porto velho, quinta-feira 23 de janeiro de 2025
MUNDO: Os primeiros 100 dias estão provando ser particularmente implacáveis para o primeiro governo alemão da era pós-Merkel.
Desde que assumiu o cargo em 8 de dezembro, o chanceler Olaf Scholz e seu gabinete tiveram que enfrentar um aumento sem precedentes de tropas russas ao longo da fronteira da Ucrânia e a perspectiva de uma grande guerra na Europa.
Até o momento, seu desempenho não inspira confiança sobre a capacidade da Alemanha liderar neste momento de crise.
Aproximadamente metade das importações de gás natural da Alemanha vem da Rússia. Essa dependência se tornará cada vez mais importante nos próximos anos, à medida que a Alemanha embarcar em uma redução simultânea do carvão e da energia nuclear.
A Rússia também é um destino importante para as exportações alemãs. E por razões históricas, os líderes alemães há muito desejam estreitar as relações com a Rússia.
Lenta, mas certamente, a Alemanha se manobrou para uma posição de vulnerabilidade em relação ao Kremlin.
A complicada relação da Alemanha com a Rússia é única entre os vizinhos europeus. O primeiro chanceler social-democrata (SPD, da sigla em inglês para Partido Social-Democrata) do país, Willy Brandt, buscou acalmar as coisas com a União Soviética a partir de 1969.
A “Ostpolitik” de Brandt – normalização das relações entre a Alemanha Ocidental e a Europa Oriental – abriu caminho para o Ato Final de Helsinque de 1975, que reconhecia as fronteiras nacionais da Europa pós-guerra.
Este foi um objetivo importante para os líderes soviéticos, ansiosos por escorar seus satélites do Leste Europeu. Mas deu também aos dissidentes e ativistas dos direitos civis no império soviético um manifesto pela reforma liberal.
Mas a Rússia em 2022 – como ficou bastante claro em suas demandas por uma revisão geral da ordem de segurança europeia que ela colocou diante dos Estados Unidos e da Otan em dezembro – é uma fera muito diferente da União Soviética do final da Guerra Fria, que buscava consolidação política e dinheiro vivo.
A Rússia de Vladimir Putin também não está interessada em se juntar ao Ocidente político, como parecia estar durante a década de 1990.
Em vez disso, o presidente russo detesta a presença contínua dos Estados Unidos na Europa, simbolizada pela aliança da Otan. Ele vê a União Europeia como fraca e dividida, e a democracia liberal fadada ao fracasso.
Putin liderou pela primeira vez a acusação contra a hegemonia global dos Estados Unidos na Conferência de Segurança de Munique, em 2007.
Em 2014, apenas alguns meses após a anexação da Crimeia pela Rússia, Putin fez um discurso no Valdai Discussion Club, em Sochi. O tema da conferência sobre política internacional foi: “Novas regras ou um jogo sem regras?”
O espectro de um outro ataque contra a Ucrânia deve forçar uma resposta agora. E isso faz questionar a política da Alemanha com a Rússia nas últimas duas décadas.
Desde 2000, os governos alemães – liderados pelo social-democrata Gerhard Schröder, que tem estreitos laços pessoais e comerciais com a Rússia, e depois pela democrata-cristã Angela Merkel – buscaram aprofundar as relações para benefício mútuo, prosperidade e estabilidade. Enquanto isso, Putin identificou e cultivou pontos de pressão usar essas interdependências como arma.
O presidente russo também manipula a culpa alemã com habilidade. Ele se beneficia do fato de que muitos alemães associam as atrocidades que a Alemanha nazista cometeu contra os europeus orientais em grande parte com a Rússia.
Embora tenham sofrido proporcionalmente mais mortes e maior destruição, os poloneses, bielorrussos e ucranianos, por sua vez, recebem pouca empatia.
Ser ignorado pelos alemães é o preço que os europeus orientais pagaram pela colaboração germano-soviética durante a Segunda Guerra Mundial e a ocupação soviética da Europa Oriental a partir de 1945.
A Alemanha é, portanto, mais vulnerável à chantagem russa e mais disposta a ver Putin como merecedor de respeito e compreensão. Ele é, muitas vezes, visto como um líder poderoso e uma vítima das circunstâncias, encurralado pela implacável pressão ocidental.
Esta não é uma visão majoritária no governo alemão ou nas elites políticas. Mas, ocasionalmente, pessoas importantes, como o chefe da Marinha da Alemanha, expressam tais simpatias por Putin (e o chefe foi forçado a renunciar pouco depois).
Isso ressalta por que a liderança baseada em princípios é tão importante, e a falta de liderança alemã é tão prejudicial para os esforços ocidentais para dissuadir Moscou de uma novo ataque contra a Ucrânia.