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porto velho, sábado 23 de novembro de 2024
BRASIL: É possível distribuir juros sobre capital próprio no exercício financeiro em que a empresa obteve lucro, ainda que exista prejuízo acumulado de outros exercícios.
A conclusão é da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial ajuizado por conselheiros e acionistas do Banco do Estado de Sergipe (Banese).
O julgamento foi resolvido por 3 votos a 2 e serviu para resolver um aparente conflito entre a Lei das S.A. (Lei 6.404/1976) e a Lei 9.249/1995, que traz as regras para dedução dos juros sobre capital próprio.
Os juros sobre capital próprio representam a remuneração que as empresas pagam àqueles que investiram dinheiro na atividade exercida — comparável a um empréstimo. Esse pagamento não depende do sucesso do negócio.
De acordo com o artigo 9º, parágrafo 1º da Lei 9.249/1995, há duas possibilidades para dedução do JCP: a existência de lucros, computados antes da dedução dos juros; ou a existência de lucros acumulados e reservas de lucros.
Em ambos os casos, esses lucros precisam somar montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados.
Já o artigo 189 da Lei das S.A. exige que, antes de qualquer participação no resultado do exercício financeiro, sejam deduzidos os prejuízos acumulados e a provisão para o Imposto de Renda.
No caso em julgamento, conselheiros e acionistas do Banese aprovaram a dedução de juros sobre capital próprio nos exercícios de 2002 e 2003 antes de deduzir do resultado financeiro os prejuízos acumulados.
A conduta violou o artigo 189 da Lei das S.A. e rendeu multa aplicada pela Comissão de Valores Imobiliários (CVM), que acabou mantida pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.
Os multados foram ao Judiciário contestar a punição, mas não tiveram sucesso. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região manteve a multa aplicada pela infração ao artigo 189 da Lei das S.A.
O tema dividiu a 1ª Turma do STJ. Venceu a posição do relator, ministro Gurgel de Faria, acompanhado pelos ministros Sérgio Kukina e Benedito Gonçalves.
Para eles, a dinâmica de pagamento dos juros sobre capital próprio tem uma previsão própria e especial na legislação que, por isso mesmo, se sobrepõe ao artigo 189 da Lei das S.A.
Isso significa que a dedução dos juros sobre capital próprio pode ser feita quando a empresa obteve lucro no exercício financeiro, embora tenha acumulado prejuízo nos anteriores; ou quando teve prejuízo no exercício financeiro, mas preservou lucro acumulado anteriormente.
“Caso o propósito legal fosse proibir o pagamento dos juros sobre capital próprio por parte das empresas que amargassem prejuízo acumulado, bastaria condicionar aquele (o pagamento) à existência de lucros acumulados”, disse o ministro Gurgel de Faria.
“Diante desse raciocínio, não se justifica a manutenção da multa aplicada pela prática de conduta que era permitida pela lei”, concluiu
Ficaram vencidos a ministra Regina Helena Costa e o ministro Paulo Sérgio Domingues. Para eles, os juros sobre o capital próprio são uma forma de destinação do lucro líquido, o que torna aplicável o artigo 189 da Lei das S.A.
Ou seja, é preciso fazer o abatimento das perdas havidas em exercícios anteriores para viabilizar remuneração dos acionistas.
“A própria existência de lucro, arrolada pela Lei 9.249/1995 como elemento indispensável ao crédito de tal parcela, pressupõe antecedente abatimento de perdas anteriormente amontoadas”, destacou a ministra Regina.
Em sua análise, o artigo 9º, parágrafo 1º da Lei 9.249/1995 e o artigo 189 da Lei das S.A. são totalmente compatíveis e não precisam se sobrepor um ao outro.
Para a ministra Regina Helena Costa, entender diferente iria de encontro à lógica da Lei 6.404/1976, que privilegia a recomposição do capital social e a responsabilidade financeira em detrimento do mero pagamento de proventos aos acionistas.