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porto velho, quinta-feira 28 de novembro de 2024
Uma das promessas de campanha do presidente eleito Jair Bolsonaro, a revisão do Estatuto do Desarmamento, que completa 15 anos em 2018, será um dos temas polêmicos a serem enfrentados pelos senadores em breve.
O assunto é controverso e divide os parlamentares. Além de divergências quanto ao mérito — se o acesso às armas aos cidadãos deve ou não ser facilitado —, há discordância também quanto ao melhor momento para se discutir e votar possíveis mudanças, visto que faltam menos de 50 dias para o fim dos trabalhos legislativos deste ano.
A maioria dos senadores ouvidos pela Agência Senado acredita que o tema deve ficar somente para o ano que vem, já que na última eleição, das 54 vagas em disputa, 46 serão ocupadas com novos nomes. É o que pensa, por exemplo, Cristovam Buarque (PPS-DF).
— Não acredito que em 2018 ainda se consiga modificar qualquer coisa minimamente substancial. Primeiro porque muitos de nós, eu inclusive, não estaremos aqui no próximo ano. Não vejo problema em votar, por exemplo, a aprovação de um embaixador. Mas na hora de votar Previdência e Estatuto do Desarmamento, não me sinto com legitimidade. Além disso, é algo que leva tempo, vai render muitos debates e passar por comissões. Não vejo como aprovar isso este ano — afirmou o parlamentar, que se diz "radicalmente contra armar a população civil".
Outro parlamentar que disse ser muito difícil deliberar definitivamente sobre a questão este ano é Lídice da Mata (PSB-BA), que assumirá um mandato na câmara dos Deputados a partir de 2019.
— Acho quase impossível. Duvido que deputados e senadores que não se reelegeram queiram mexer num vespeiro desse. Da mesma forma que existe um grupo radicalizado querendo armar o Brasil, existe também um grande número de pessoas que são contra a liberação total das armas — opinou a senadora, que também é contra mudança no Estatuto.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) vai mais longe. Para ele é impossível o atual Congresso tratar do assunto. Segundo o representante reeleito do Amapá, trata-se de uma pauta exaustivamente debatida durante a última campanha eleitoral e que tem de ser tratada pela próxima legislatura.
— Se o presidente eleito quer mesmo enfrentar essa matéria, ele que encaminhe para o Legislativo a partir do ano que vem. Nós não temos delegação para tratar desse assunto. O governo eleito no último domingo tem que enfrentar as pautas que ele mesmo apresentou durante a campanha — afirmou.
Opiniões parecidas têm dois representantes do Rio Grande do Sul no Senado: o senador Paulo Paim (PT), que é contra facilitar o acesso da população às armas, e o senador Lasier Martins (PSD), que é a favor de modificações na legislação. Ambos continuarão no Senado no próximo ano e acham difícil votação agora em 2018.
— Acho complicado mexer no Estatuto neste ano com o atual Congresso. Poderíamos fazer isso no começo do ano que vem. Mas, seja agora ou depois, sou a favor da flexibilização. As pessoas têm o direito de ter uma arma em casa ou no campo que pelo menos lhes dê condições de se defenderem dos bandidos — afirmou Lasier.
Vontade política
Já para os senadores Magno Malta (PR-ES), José Medeiros (PSD-MT) e Flexa Ribeiro (PSDB-PA), a questão está relacionada pelo tempo exíguo até o fim da legislatura, mas pelo interesse dos parlamentares.
— Tempo há, sim. Desde que haja vontade política. Quando o Parlamento quer e define, as coisas andam — afirmou Flexa Ribeiro.
Cotado para ser ministro do novo governo e um dos parlamentares mais próximos de Jair Bolsonaro, o senador Magno Malta (PR-ES), que não foi reeleito, lembra que até a votação do Orçamento em dezembro, o Congresso Nacional estará em amplo funcionamento.
— Se tiver boa vontade, eu já vi texto constitucional ser mudado sem respeitar prazo, tempo e passando por cima de tudo. A gente não viu o Lewandowski rasgar a Constituição e dar direito político para Dilma Rousseff aqui na frente de todo mundo? Então, quando eles querem, as coisas acontecem — disse.
Projetos
Para Magno Malta, que defende alterações na legislação, há propostas na Câmara dos Deputados mais adiantadas — prontas para o Plenário — e que podem servir de base para votações. Na opinião dele, seria melhor, por exemplo, do que insistir no Projeto de Decreto Legislativo (PDS 175/2017), que já recebeu voto favorável do relator Sérgio Petecão (PSD-AC) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A proposta, de autoria do senador Wilder Morais (DEM-GO), convoca plebiscito sobre a revogação do Estatuto do Desarmamento.
— Fazer outro plebiscito é gastar tempo e dinheiro. Acho que o Brasil está muito maduro em relação ao assunto. Estamos num país com alto índice de violência. Não estamos no país de Alice, nem no fantástico mundo de Bobby. O Brasil sabe o que quer — afirmou.
Novatos
A participação da população ao opinar sobre o PDS 175/2017 no e-Cidadania, canal direto de comunicação do Senado com o público, reflete a divisão da sociedade brasileira em relação ao assunto: mais de 1,5 milhão de pessoas já opinou, sendo que 894 mil se mostraram contra a iniciativa, e 656 mil ficaram a favor.
A divisão de opiniões deve persistir na próxima legislatura. Foram eleitos para o Senado candidatos notoriamente são a favor de mudanças na lei, como Major Olimpío (PSL-SP) e Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Em contrapartida, também haverá vozes contrárias, como Rogério Carvalho Santos (PT-SE).
— Sou totalmente contra armar o cidadão e contra o uso de arma de forma irrestrita. Uma sociedade não se faz com arma, se faz com educação. Por isso sou pela manutenção do Estatuto do Desarmamento e vou trabalhar para desarmar a sociedade — afirmou.