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porto velho, domingo 23 de março de 2025
Manchete positiva não vende jornal. Esta verdade pode ser aplicada ao telejornalismo. São as coberturas de tragédias que mais rendem audiência. Como agora, no caso da morte de Vitória Regina de Sousa, de 17 anos, em Cajamar, na Grande São Paulo.
Desde o seu desaparecimento, em 26 de fevereiro, no caminho entre um ponto de ônibus e sua casa, telejornais focados em ocorrências policiais acompanharam as buscas, a localização do corpo com sinais de agressão, o apontamento de suspeitos e outros detalhes da investigação.
Possuídos pelo sensacionalismo diante da oportunidade de elevar os índices no Ibope, alguns apresentadores se comportam como detetives. Outros, parecem inquisidores ao entrevistar parentes da vítima. Sobram exageros e ‘achismos’, falta o imprescindível comedimento.
Por exemplo, o veterano Roberto Cabrini, a quem se deve respeito pela trajetória profissional, errou ao gravar com o pai de Vitória, Carlos Alberto, para a Record. Deu a ele a notícia de que também era considerado suspeito pela polícia. Lembrou a falha de Patrícia Poeta no ‘Encontro’, da Globo, ao comunicar ao mesmo homem, ao vivo, a identificação de um suspeito do crime.
Cabrini perguntou a Carlos Alberto se a inclusão do nome dele na lista de investigados “tirava sua tranquilidade”. Como questionar sobre tranquilidade a um pai que acabou de enterrar uma filha assassinada com crueldade e passa a ser visto com desconfiança?
As matérias sobre o ‘caso Vitória’ repercutiram na audiência de algumas atrações. Na segunda-feira (10), o ‘Cidade Alerta SP’ marcou média de 9.7 pontos, 20% maior do que uma semana antes. ‘Tá na Hora com Datena’, do SBT, e ‘Brasil Urgente’, da Band, também investiram na pauta. No domingo, o ‘Fantástico’, da Globo, exibiu reportagem.
Na guerra diária por audiência qualquer décimo extra – equivalente a 20 mil pessoas diante da TV na Grande São Paulo – faz diferença no Ibope, ainda mais no período atípico de Carnaval.
A overdose na TV em relação ao destino nefasto da jovem Vitória traz à memória outras coberturas igualmente exploradoras, a exemplo do sequestro e assassinato de Eloá Cristina por Lindenberg Alves, o rapto e morte de Liana Friendback e Felipe Café, a trama macabra de Suzane von Richthofen contra seus pais Marísia e Manfred.
O telejornalismo precisa evitar o tom novelesco e a espetacularização da desgraça alheia. Não pode conferir status de celebridade do crime a autores dos delitos. E o telespectador deve controlar seu sadismo e não consumir o noticiário policial como se fosse entretenimento.