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porto velho, terça-feira 16 de setembro de 2025
Notícias sobre lojas sendo fechadas estão cada vez mais frequentes. De janeiro para cá, varejistas tradicionais no mercado brasileiro já baixaram as portas de mais de 110 pontos comerciais e anunciaram que vão encerrar as operações de outros cem nos próximos meses. O alto número de lojas fechadas coincide com o endividamento dessas empresas e com o aumento dos pedidos de falência e de recuperação judicial.
Segundo levantamento da Serasa Experian, só nos primeiros três meses de 2023 o número de pedidos de falência subiu 44% em relação ao do mesmo período do ano passado. No caso das recuperações judiciais, na mesma comparação, a alta foi de 37,6%.
Apesar das dificuldades financeiras, as empresas explicam que o fechamento das lojas faz parte de uma estratégia comum do varejo, que precisa reavaliar constantemente o desempenho dos pontos de venda. Especialistas consultados pela reportagem dizem que diversos fatores entram em jogo na decisão de encerrar as atividades dos estabelecimentos, que vão de problemas internos, na gestão da própria empresa, a aspectos econômicos e sociais, como a taxa de juros elevada e mudanças no comportamento dos consumidores.
A primeira crise a estourar neste ano foi a da Americanas, na primeira quinzena de janeiro. Antes de entrar em recuperação judicial, a empresa dizia ter 1.863 lojas espalhadas pelo país, sem contar os 1.300 estabelecimentos das marcas BR Mania e Local, abertos em parceria com a Vibra. Entre janeiro e março, a varejista, que tem dívidas de R$ 42,5 bilhões, fechou 17 de suas unidades, número que, segundo analistas do mercado, agora já passa de 20.
Até o momento, a empresa não anunciou quantas lojas pretende manter em funcionamento, mas a expectativa é de que o corte atinja 4% das unidades ainda neste ano, o que corresponde a pouco mais de 70 estabelecimentos.
A crise da Americanas afastou os consumidores, tanto das lojas físicas quanto do ecommerce. Documentos da recuperação judicial mostram que o faturamento dos canais online recuou 7,7 vezes entre novembro de 2022 e fevereiro de 2023 e passou de R$ 1,4 bilhão para R$ 180 milhões. A empresa tem quase 10 mil credores, dos quais 12 são bancos. A dívida que tem apenas com essas instituições é de R$ 26,4 bilhões.
Para Ulisses Ruiz de Gamboa, economista da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), uma das maiores dificuldades que as empresas enfrentam hoje é a falta de crédito. "O varejo está vendendo menos, precisa de fôlego e não consegue, por causa dos juros elevados, que encarecem qualquer tipo de negociação", afirma.
Ele se refere à dificuldade que as companhias enfrentam para obter empréstimos nos bancos e em outras instituições financeiras, o que pode ser resultado do "efeito Americanas". "A concessão de crédito a pessoa jurídica sempre teve juros mais altos, mas a oferta tem diminuído. Os bancos estão mais temerosos, a inadimplência aumentou... São vários fatores que influenciam ao mesmo tempo", explica.
Para Fábio Sobreira, analista-chefe e sócio da Harami Research, a crise de crédito atrapalha os planos de recuperação das varejistas. "O crédito está muito caro, o que dificulta os empréstimos. Está caro para vender, está caro para o cliente comprar e para o comerciante conseguir fazer capital de giro. E tudo isso porque as taxas de juros estão altas, o que vem prejudicando o varejo como um todo."
A decisão de fechar lojas, segundo Gamboa, tem relação direta com os juros altos, a escassez de crédito e a situação econômica das famílias. "Também existem possíveis problemas de gestão nas empresas, decorrentes de dificuldades que podem ter começado na pandemia. Foi um período com altos e baixos da renda, em que foi muito difícil prever o consumo. Problemas de gestão começaram aí", avalia o economista.
Ele cita adaptações que foram necessárias e urgentes naquele momento, como a implantação de sistemas de entrega e de delivery, e o aumento dos estoques. "Foi um ponto de inflexão para o varejo. Também precisamos considerar que o perfil do consumidor pode ter mudado. Mesmo com o fim do isolamento, ainda tem muita gente mantendo o home office, e a permanência no lar pode ter mudado o consumo", diz.