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porto velho, sábado 23 de novembro de 2024
BRASIL: O banimento de usuário de um aplicativo de relacionamento por suposta violação às suas regras, sem que seja apontado o fato que caracterizou essa ofensa, infringe dispositivos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) e gera dano moral indenizável.
Com esse entendimento, a 3ª Turma Cível do Colégio Recursal dos Juizados Especiais de São Paulo julgou parcialmente procedente o recurso inominado de um usuário do Tinder e condenou a plataforma a indenizá-lo em R$ 10 mil.
“A desativação do perfil da parte autora sem fundamentação, com insinuações de condutas irregulares, tem expressão suficiente para atingir a esfera moral do indivíduo”, assinalou o juiz Carlos Ortiz Gomes, relator do recurso.
Conforme o julgador, cujo voto foi acompanhado pelos juízes Celso Alves de Rezende e Olavo Paula Leite Rocha, a hipótese dos autos não se enquadra naquilo que se convencionou chamar de “meros aborrecimentos do cotidiano”.
Por ter a conta desativada sem justo motivo, o usuário ajuizou ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de dano moral contra a empresa Par Perfeito Comunicação, responsável pelo Tinder. Ele pediu a reativação do perfil e R$ 12 mil de indenização.
A empresa justificou que a conta do autor da ação foi banida de maneira “motivada e legítima”, em decorrência de violação de regras do aplicativo, após denúncias de outros usuários sobre conduta expressamente vedada pelas normas da plataforma.
Como a empresa não apresentou provas daquilo que alegou, a juíza Carla Zoéga Andreatta Coelho, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível do Foro Regional do Ipiranga, na capital paulista, condenou-a a reativar o perfil do autor. Porém, negou o pedido de indenização.
“No caso concreto, não há prova de qualquer mácula a direito da personalidade do autor além daquelas inerentes ao negócio frustrado, donde a inexistência de dano moral indenizável”, sentenciou a magistrada.
A juíza citou o Enunciado 6 da Turma de Uniformização do Sistema de Juizados Especiais do Estado de São Paulo: “Mero inadimplemento contratual, sem circunstâncias específicas e graves que a justifiquem, não dá ensejo a indenização por danos morais”.
O relator do recurso, porém, observou que muitas das condutas capazes de gerar o banimento do aplicativo são gravíssimas, envolvendo, em algumas hipóteses, atos criminosos. Desse modo, negar o dano moral ao usuário seria aprovar a conduta do fornecedor.
Gomes acrescentou que a indisponibilidade “imotivada e desarrazoada” da conta do usuário revelou falhas da plataforma no dever de informar e violação ao direito de defesa, previstos, respectivamente, nos incisos III e VIII do artigo 6º do CDC.
“Não deve ter lugar o procedimento secreto e insondável, sob pena de se criar atmosfera propícia ao arbítrio. Violação aos direitos básicos do consumidor. Patente a falha dos serviços prestados”, concluiu o acórdão.
A necessidade de salvaguardar o equilíbrio da relação contratual, nos termos do artigo 4º, inciso III, do CDC, foi apontada pelo colegiado. Ao fixar a indenização em R$ 10 mil, ele justificou que o valor atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.