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porto velho, quinta-feira 20 de novembro de 2025

MUNDO: O primeiro turno das eleições presidenciais do Chile no último domingo (16) evidenciou o movimento da sociedade à direita.
A candidata comunista Jeanette Jara teve um desempenho abaixo do previsto pelas pesquisas e uma vantagem menor do que o esperado sobre o ultradireitista José Antonio Kast, que disputará com ela o segundo turno.
Somados, os candidatos das diferentes correntes de direita obtiveram mais de 50% dos votos válidos.
De acordo com uma pesquisa do UDD Citizen Panel, realizada entre as 21h30 do último domingo (16) e o meio-dia de segunda-feira (17), 61% dos entrevistados disseram que votariam em Kast, contra 39% que optariam por Jara no segundo turno.
Para analistas, o giro, após quatro anos de governo do esquerdista Gabriel Boric, está ligado à frustração da sociedade com a esperança que sucedeu os protestos massivos de 2019 contra o modelo econômico e por demandas sociais.
“As expectativas com Boric eram muito altas inicialmente. Mas ele não tinha maioria no Congresso e o processo constituinte também levou a um cansaço com os simbolismos e o excesso de wokismo”, afirma Francisco Castañeda, economista da Universidade Central do Chile.
Boric, que chegou ao poder apoiando a redação de uma nova Constituição - resposta da classe política às mobilizações -, acabou abandonando o apoio à iniciativa após duas rejeições, em plebiscitos, a propostas de textos constitucionais.
“Os resultados da proposta de uma nova Constituição e da geração liderada por Boric não foram milagrosos, são discutíveis e para um segmento importante da população foram negativos”, avalia o sociólogo chileno Eugenio Tironi.
A frustração com o processo constituinte e com a “nova esquerda” personalizada em Boric, se somaram, segundo Tironi, à centralidade que a criminalidade e a imigração ganharam no debate público.
“Apesar de este governo ter sido muito severo em relação a estes temas, a percepção é de que o que foi feito foi pouco e que um governo de direita faria melhor”, diz.
Castañeda concorda que a questão da segurança cidadã foi o leitmotiv da eleição. O Chile viu a taxa de homicídios subir de 2,32 por 100 mil habitantes em 2015 para 6 em 2024, enquanto os sequestros atingiram um recorde no ano passado.
“Não acho que a população acredite que a direita tenha a solução para este problema, mas está dando uma oportunidade para ela”, pontua o economista.
Tironi também destaca que persistem no Chile problemas de qualidade de vida, como no acesso a emprego e moradia, e existem críticas em relação ao desempenho estatal.
“O Estado chileno cresceu e é forte, mas há a visão na sociedade de que este não responde como deveria às necessidades das pessoas, principalmente na área de saúde. E há a sensação de que a direita tem mais capacidade de administração”, considera.
O analista também observa que o movimento à direita não foi somente do eleitorado, mas também da principal candidata da esquerda.
“Quando se observam as propostas de Jara, os temas são os mesmos da direita: segurança, crescimento e eficiência estatal. Não tem nada que remeta a woke, agendas identitárias, mudança climática ou propostas revolucionárias”, diz Tironi. “Ela traz propostas muito à direita do que eram as de Boric em 2021. É um giro completo, não somente de alguns atores”, afirma.
Nos últimos 15 anos, o Chile viveu uma alternância pendular entre governos de direita e de centro-esquerda. Após governar o país entre 2006 e 2010, Michelle Bachelet, do Partido Socialista, foi sucedida pelo direitista Sebastián Piñera, do partido Renovación Nacional.
Bachelet voltou ao poder de 2014 a 2018 e foi novamente sucedida por Piñera, que presidiu o Chile novamente de 2018 a 2022. Ele foi sucedido pelo atual presidente de esquerda, Gabriel Boric. E agora, segundo as pesquisas eleitorais, a previsão é que Kast seja o próximo presidente do país.
Castañeda observa, no entanto, que a proposta de Kast de promover uma redução tributária de 27% e de corte do gasto público em 7% do Produto Interno Bruto em quatro anos poderia aumentar o déficit fiscal, a dívida pública e impactar o investimento público e o gasto social.
Se o ajuste for brusco, segundo ele, o efeito poderia ser uma mudança no humor do eleitorado. “O eleitorado chileno é muito volátil. Hoje o Chile está indo para a direita, mas se houver medidas de restrições de gastos muito extremas, pode haver rejeição. O voto no Kast não é um cheque em branco”, conclui.