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porto velho, quinta-feira 28 de novembro de 2024
O mergulhador profissional Emiliano Pescarolo contraiu o novo coronavírus em março e passou 17 dias no hospital na cidade portuária de Gênova, na Itália, antes de ter alta no dia 10 de abril.
Agora, três meses depois, o homem de 42 anos ainda tem dificuldade para respirar. "Desde que voltei para casa, mesmo depois de semanas, eu não pude ver nenhum progresso: se eu fazia uma pequena caminhada, era como se estivesse escalando o Monte Everest. Eu ficava sem ar só de falar. Fiquei muito preocupado", disse.
A longo prazo
As preocupações de Pescarolo são familiares para muitos pacientes que tiveram casos confirmados ou suspeitos no Reino Unido.
Mais de 8.500 pessoas se juntaram ao Grupo de Apoio da Covid Longa no Facebook desde sua criação em maio, pedindo por reabilitação, pesquisa e reconhecimento.
Outro grupo, o LongCovidSOS (Covid Longa SOS, em tradução livre), também está fazendo campanha para que o governo reconheça as necessidades dos sofredores com a Covid-19 em longo prazo e garantam que eles não sejam discriminados por seus empregadores.
Enquanto algumas dessas pessoas foram tratadas em hospitais, outras se recuperaram da doença em casa. Muitos não tiveram o diagnóstico confirmado, apesar dos sintomas. Em alguns desses casos, eles não conseguiram ser testados por conta da falta de capacidade nas primeiras semanas do pico da epidemia no Reino Unido, até para profissionais de saúde. Outros até foram testados, mas o resultado foi negativo.
Claudia de Freitas, uma enfermeira de cuidados intensivos de 34 anos de Londres, é parte da comunidade LongCovidSOS. Falando à CNN de sua casa no sul da capital inglesa, ela conta que testou negativamente para o vírus, mas depois detectou anticorpos em 7 de julho.
Freitas ficou doente no meio de março, com tosse, febre ocasional, dificuldade para respirar, dores no peito e perda do olfato. Depois de alguns dias, suas dores no peito ficaram tão severas e seu batimento cardíaco tão irregular que ela pensou estar tendo um infarto. Seu marido, que é médico, a levou para o pronto-socorro, ela conta.
Os médicos fizeram um raio-X do peito e exames de sangue, mas tudo estava normal, incluindo seus níveis de oxigênio, disse. Após sua segunda passagem no hospital, disseram a ela que o raio-X mostrava pneumonia e que o médico suspeitava que fosse Covid-19. No entanto, só recomendaram a ela que fosse para casa, descansasse e tomasse analgésicos.
"É difícil, mas tenho a impressão de que pessoas passando por isso agora terão mais ajuda", disse. "Agora os médicos pensariam, ok, vamos investigar mais".
Margaret O'Hara, que trabalha no departamento de pesquisa de um hospital no interior da Inglaterra, é uma das administradoras do Grupo de Apoio da Covid Longa. Ela, como muitos outros, não testou positivo mas seu médico a considerou um caso suspeito em um atestado para o trabalho.
Quando ela ficou doente no fim de março, "me atingiu como um ônibus", disse. Ela teve tosse, falta de ar e fadiga que a deixou de cama por duas semanas. "Se não fosse o meio de uma pandemia, eu estaria internada no hospital, porque não conseguia respirar direito", disse. Entretanto, ciente da mensagem do sistema de saúde de que as pessoas deveriam evitar os hospitais a não ser que fosse absolutamente necessário, ela ficou em casa.
Eventualmente, depois de três semanas, o médico dela a enviou ao pronto-socorro porque ela estava tendo dificuldade para respirar —mas um raio-X do peito não detectou nada e não havia marcadores de infecção, ela disse.
Passaram-se oito semanas até o seu primeiro dia sem tossir, disse ela, que tem 50 anos e mora com seu marido e filha de 10 anos em Birmingham, no centro da Inglaterra. Ela conseguiu caminhar 800 metros naquele dia — e, no seguinte, já estava tossindo novamente. Ela foi novamente para o pronto-socorro no começo de julho após sua saúde piorar de novo.
"Agora sinto que estou de volta aonde estava na semana quatro ou cinco. Eu não consigo caminhar nenhuma distância", disse O'Hara, que disse que, antes disso, estava em forma e sem nenhuma doença pré-existente. Ela continua dispensada do trabalho e está aguardando uma consulta marcada com um especialista pulmonar.
Como Pescarolo, O'Hara percebeu que sua mente está menos apurada. "É como se fosse uma neblina cerebral, eu não consigo funcionar. Eu tenho um PhD em física e não consigo conectar dois pensamentos", disse.
No entanto, como administradora do grupo de apoio, ela está ciente de que é sortuda por ter um empregador e uma família que a apoiam.
"Tem muitas pessoas que estão em um limbo porque não foram testadas em março ou seus testes deram falso negativo e muitas pessoas estão tendo problemas com empregadores que estão lhes dizendo para voltarem ao trabalho", conta.
"Acho que eles têm essa ideia simplista de que se você não estava no hospital, a doença foi moderada e você vai ficar bem, mas é errado, é muito falso, porque há um grupo como eu", disse.
Ela também está preocupada que a pesquisa dos efeitos de longo prazo da doença esteja focando naqueles que estavam hospitalizados. "Ninguém está nos pesquisando, os que não estiveram no hospital — somos apenas deixados de fora do sistema", disse. "Esse é realmente um problema".
'Pareço alguém de 80 anos'
Grace Dolman, uma médica de 39 anos do hospital Addenbrooke, em Cambridge, também ficou doente em março. Ela também ficou em casa lutando contra uma tosse e dificuldades para respirar mas, em retrospecto, diz que ela deveria ter ido para o hospital.
"Eu estava com falta de ar e continuava pensando 'na próxima semana, estarei melhor'", disse. Depois de cinco semanas, no meio de abril, ela foi para o hospital para um raio-X do peito, mas seu teste para o vírus deu negativo.
"Minha respiração ficou melhor. Eu tinha uma confusão mental muito ruim, minha memória estava muito ruim, não conseguia me concentrar, estava muito sensível e muito, muito cansada, eu não conseguia fazer nada", disse. "Até agora, 17 semanas depois, eu ainda não consigo trabalhar, só consigo aguentar duas horas de atividade e depois tenho que me deitar".
Dolman diz também sofrer com dores musculares e formigamento nas mãos e nas solas dos pés.
"Eu pareço alguém de 80 anos, basicamente. Tenho que fazer um pouquinho e parar, mais um pouquinho e parar".
Como profissional médica, Dolman está preocupada que mais pessoas estejam sofrendo com os efeitos de longo prazo da Covid-19 que não estejam sendo ouvidas e que podem não conseguir os cuidados específicos que podem necessitar.
"Não há uma única abordagem para isso, as pessoas têm sintomas diferentes e necessidades diferentes e vão precisar de apoio diferente", contou.
"Acho que é perigoso agrupar todos juntos e dizer que eles têm esses sintomas e dispensá-los com 'você tem Covid de longo prazo, mas vai melhorar'."
Efeitos 'bastante debilitantes'
O secretário de Saúde do Reino Unido, Matt Hancock, que contraiu a Covid-19 em março, reconheceu a escala do problema nesta quarta-feira (15), quando disse ao canal Sky News que havia "evidência crescente de uma minoria de pessoas —mas uma minoria significante— que tinham impactos de longo prazo" da doença, que poderiam ser "bastante debilitantes".
"É realmente importante que nós apoiemos as pessoas nessa situação, e que também pesquisemos para descobrir o que podemos fazer sobre isso", disse.
Mais cedo neste mês, Hancock anunciou um grande estudo sobre os efeitos de longo prazo da Covid-19 em pacientes que estiveram hospitalizados. A pesquisa, chamada de Phosp-Covid, almeja acompanhar 10 mil pessoas pelos próximos 12 meses ou mais.
O NHS (Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido) também planeja disponibilizar uma plataforma online para apoiar a recuperação de pacientes de Covid-19 e, em maio, abriu um novo centro de reabilitação no sul da Inglaterra, o Centro NHS Seacole, em Surrey, para ajudar os mais afetados. Outros hospitais também estão começando a oferecer serviços de reabilitação.
O líder do estudo Phosp-Covid, Chris Brightling, professor de medicina respiratória na Universidade de Leicester, disse à CNN que o estudo é o maior de seu gênero que ele conhece em todo o mundo.
"O que realmente queremos entender é, depois que os pacientes com Covid-19 têm alta do hospital, quais são as consequências", disse. O melhor é que não fossem nenhuma, mas é altamente provável que sejam um grande número de problemas, que podem ser fadiga crônica, dor de cabeça e muscular, pouca tolerância a exercícios, falta de ar, entre muitos outros.
"É desafiador entender a escala deste fardo, qual é sua severidade e o que podemos fazer sobre ele".
Os 10 mil indivíduos convidados para participar dos testes terão de preencher questionários detalhados, fazer exames de sangue, passar por monitoramento enquanto se exercitam e por exames de imagem dos pulmões e outros órgãos, disse. "Obviamente estaríamos acompanhando a evolução também, então seria mais amplo que os estudos que já foram realizados até o momento".
Brightling disse que o estudo será focado em casos confirmados de Covid-19 que estiveram hospitalizados, porque no começo da pandemia no Reino Unido, a testagem era quase exclusivamente feita em hospitais.
"Isso significa que temos uma amostragem de pessoas que sabemos com certeza que tiveram a infecção", disse. Eles também são os considerados "mais suscetíveis a terem consequências severas de longo prazo da doença", disse, então vão dar uma ideia da magnitude e gravidade desses efeitos.