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porto velho, quinta-feira 28 de março de 2024
É bom nossos líderes “já ir se acostumando”, para usar um bordão famoso da eleição presidencial de 2018. E repito: é bom que todos os líderes institucionais, do executivo ao legislativo e destes para o judiciário (e vice-versa), se acostumem com essa condição fundacional, o Estado democrático de direito na correlação de direitos humanos, pluralismo/diversidade, devido processo legal e separação de/entre poderes; e é bom também os cidadãos, todos indistintamente, já irem se acostumando: a democracia é valor fundacional e veio para ficar; as instituições, os direitos fundamentais, o devido processo legal e a separação entre poderes vieram para ficar, como valores fundacionais que são, e não serão destruídos ou fragilizados por qualquer aspirante a golpista, seja da extrema direita, seja da extrema esquerda.
De fato, já vivenciamos tanta desestruturação antissistêmica em relação às nossas instituições que sabemos à exaustão dos graves males que emergem sempre que essas mesmas instituições são colocadas em xeque ou violadas desde dentro e desde fora em sua integridade. Precisamos de estabilidade institucional para que, por meio dela, nossa sociedade possa ser estruturada e reflexivizada e para que nossa vida possa seguir normalmente, para que possamos, por meio do estudo e do trabalho, construir nossos sonhos. A ameaça do golpe, ou mesmo sua concretização, coloca em xeque – ou destrói – tudo aquilo que foi arduamente conquistado ao longo de nossos anos republicanos.
Note-se bem, antes de qualquer outra reflexão, que estabilidade institucional, no contexto da separação entre poderes, aponta para a centralidade do processo de juridificação do poder e, assim, de judicialização da política, na qual o judiciário de um modo geral e o Supremo Tribunal Federal em particular, por serem os guardiães últimos da interpretação constitucional e de reflexivização dos legislativos e executivos, pode ser acionado para dar validação ao que estes fazem em termos normativos e administrativos. Então, a ideia de que o judiciário, na medida em que enquadra legalmente aos executivos e legislativos, se intromete em uma seara que não é sua, não é verdadeira. Os casos práticos em que isso acontece de fato merecem investigação e punição adequadas, mas prima facie a judicialização é um dos princípios estruturantes da democracia.
Dito isso, ninguém mais suporta intervenções antissistêmica nas instituições, seja a partir da sociedade civil, seja desde dentro dessas mesmas instituições. A crise dos movimentos comunistas é, da mesma forma, uma crise dos movimentos fascistas, isto é, dos grupos de extrema direita, porque ambos compartilham dessa tendência comum de uma derrubada do Estado democrático de direito e de uma negação/destruição dos direitos humanos, do pluralismo/diversidade e dos direitos fundamentais, do devido processo legal e da separação entre poderes.
Nesse sentido, a carta pela democracia, encabeçada pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e referendada por grandes nomes do empresariado, por artistas, intelectuais e outros simpatizantes, expressa o óbvio ululante: não queremos mais aventureiros contra as instituições! Queremos gestores públicos e lideranças políticas comprometidos com sempre mais democracia, com sempre mais institucionalidade, com sempre mais lisura e transparência. Queremos gestores públicos e lideranças políticas proativos, que se esforçam por melhorar nossa condição de vida em termos de reconhecimento cultural, inclusão social e justiça política, tudo isso por meio da transparência e da moralidade institucionais.
E estes gestores e lideranças precisam sempre saber que não queremos mais (em particular, ideias mirabolantes ou estrambóticas) e que eles não podem fazer menos do que isso. Sob pena de, ou serem presos, ou perderem as eleições e serem defenestrados da vida pública.