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porto velho, quinta-feira 19 de junho de 2025
BRASIL: O julgamento em que o Tribunal Superior do Trabalho vai definir os requisitos para a concessão da gratuidade de Justiça a sindicatos tem potencial para definir a representatividade judicial de parte dessas entidades e pode promover uma onda de ações coletivas.
Essa é a opinião da maioria dos especialistas consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre o recurso repetitivo que discute o assunto no TST.
No dia 15 de maio, o tribunal publicou edital para que interessados se manifestem sobre o julgamento. A questão discutida é se a concessão do benefício da justiça gratuita a sindicato depende de prova inequívoca de que a entidade não pode arcar com as despesas do processo ou se basta a mera declaração de hipossuficiência.
O advogado Ricardo Calcini, fundador do Calcini Advogados, professor do Insper e colunista da ConJur, explica que se o TST entender que basta uma mera declaração de hipossuficiência econômica, a decisão deve fomentar um crescente número de ações coletivas.
“A confirmar o ajuizamento de novas ações pelos sindicatos profissionais, as discussões na Justiça do Trabalho assumirão um importante aspecto coletivo, em detrimento da ordem individual hoje preponderante em nosso sistema. Para além disso, na condição de substituto processual, o sindicato passará a tutelar direitos transindividuais da categoria, que não necessariamente são abarcados pelas ações individuais”, argumenta.
Segundo o especialista, poucos trabalhadores ajuízam ações individuais após o término da relação trabalhista, e o número é ainda menor durante a vigência do pacto laboral. Diante disso, a atuação coletiva via sindicato garantirá o cumprimento de questões relacionadas ao meio ambiente do trabalho, jornada, remuneração, dentre outros direitos sociais que, não raras vezes, são desrespeitados por não haver judicialização.
O advogado Sergio Pelcerman, sócio da área trabalhista do escritório Almeida Prado & Hoffmann, explica que o julgamento do TST vai pacificar a controvérsia surgida com a alteração dos artigos 578 e 579 da CLT, que tornou facultativa a contribuição sindical
“Isso impactou diretamente as receitas das entidades sindicais e trouxe à tona a discussão sobre a capacidade financeira dos sindicatos para suportar os encargos processuais, sem prejuízo de suas atividades institucionais”, avalia.
Pelcerman destaca que o recurso tem origem em demanda ajuizada pelo Sindicato dos Profissionais que Trabalham com Radiação, Auxiliares, Ultrassonografia e Xeroradiografia de Minas Gerais, que pleiteou a gratuidade da justiça.
O pedido formulado pelo sindicato encontra respaldo no artigo 98 do CPC, que garante o direito à gratuidade da justiça à pessoa natural ou jurídica que comprove insuficiência de recursos para custear as despesas processuais. Soma-se a isso a previsão contida no artigo 87 do Código de Defesa do Consumidor e no artigo 18 da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), que asseguram, nas ações coletivas, isenção de custas e despesas, salvo comprovada má-fé.
Esses fundamentos vêm sendo acolhidos por parte da jurisprudência, como exemplifica a Súmula 60 do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES). A norma estabelece que, no exercício da substituição processual, o sindicato faz jus à gratuidade de justiça, aplicando-se as regras das ações coletivas, condicionando-se eventuais condenações por custas e honorários à demonstração de má-fé da entidade.
“A instauração do incidente pelo TST reflete, portanto, a necessidade de uniformização da jurisprudência trabalhista sobre o tema, haja vista a existência de decisões divergentes, algumas entendendo que basta a declaração de hipossuficiência, enquanto outras exigem a efetiva comprovação da incapacidade financeira da entidade sindical. Essa definição é particularmente relevante em razão das mudanças no financiamento sindical, resultantes do fim da compulsoriedade da contribuição, que afetou a sustentabilidade financeira de diversas entidades”, diz.
A advogada Evely Cavalcanti, do Serur Advogados, acredita que o julgamento terá impactos relevantes, já que a tese a ser firmada terá efeitos vinculantes e influenciará diretamente a atuação dos sindicatos em litígios coletivos.
“A tese vinculante no referido incidente terá impacto e efeitos diretos sobre a atuação das entidades sindicais no âmbito da Justiça do Trabalho, notadamente nas demandas em que exercem a substituição processual, quando representam os interesses da categoria de trabalhadores, independentemente de autorização expressa dos substituídos”.
Opinião parecida tem Ana Carolina Aspar, do escritório Gaia Silva Gaede Advogados. Apesar de ser uma entidade jurídica de Direito Privado, ressalta, os sindicatos, quando atuam em nome de Direito Coletivo, ganham uma roupagem semelhante ao do Ministério Público, no que diz respeito a defesa de direitos homogêneos.
“Para o futuro, na ocasião de o TST pacificar o entendimento de que haverá presunção de veracidade quanto a alegação do sindicato de insuficiência de recursos, é importante destacar que essa discussão está restrita à ocasião em que os sindicatos defendem direitos coletivos, isto é, não é qualquer atuação sindical que terá a regra aplicada”, esclarece.
O julgamento ainda não tem data definida, mas a expectativa é que ele ocorra até a mudança da gestão do TST, que ocorre em outubro.