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porto velho, sexta-feira 18 de abril de 2025
BRASIL - A 5ª turma do STJ deu parcial provimento ao recurso da defesa da médica Virgínia Soares de Souza, acusada por antecipar a morte de pacientes internados na UTI, determinando que provas obtidas pela busca e apreensão de 1.670 prontuários médicos não poderão ser utilizadas em ações penais sobre o caso.
A decisão não suspende os processos em curso, mas impede que decisões judiciais se apoiem nas provas consideradas inválidas. O resultado foi definido por empate na votação, situação que beneficia a parte ré.
O caso
Virgínia Soares de Souza, ex-chefe da UTI do antigo Hospital Evangélico de Curitiba, responde a dezenas de ações penais por supostamente antecipar a morte de pacientes enquanto chefiava a UTI do então Hospital Evangélico de Curitiba.
As investigações tiveram origem em uma busca e apreensão de 1.670 prontuários médicos. Segundo o MP/PR, as mortes teriam ocorrido entre 2011 e 2013, e a médica administrou sedativos e analgésicos em excesso, além de reduzir a oxigenação de pacientes, com o objetivo de liberar leitos da UTI.
A defesa, por sua vez, afirmou que todos os procedimentos médicos estavam respaldados por literatura científica, negando qualquer irregularidade.
Em 2013, o parquet denunciou a médica e sete funcionários da UTI subordinados à ela por homicídio qualificado de sete pacientes. O juiz Daniel Surdi Avellar, da 2ª vara do Tribunal do Júri de Curitiba, em 2017, concluiu que não havia provas suficientes para levar os réus a julgamento pelo júri popular.
A decisão foi revertida pelo TJ/PR, mas, em 2023, após recurso da defesa, a 2ª câmara Criminal do tribunal, por maioria, absolveu a médica.
O MP/PR mantém investigações e outras 80 ações penais contra a médica, com mais de 100 inquéritos policiais ainda em andamento.
STJ anula busca e apreensão de prontuários no caso da médica Virgínia Soares de Souza acusada de causar a morte de pacientes na UTI.(Imagem: Reprodução/TV Globo)
Provas ilícitas
A defesa recorreu ao STJ pedindo o trancamento das ações penais e inquéritos alegando nulidade na decisão judicial que autorizou, em 2013, a apreensão dos prontuários médicos.
Segundo os advogados, a medida foi genérica, sem especificar vítimas, e configuraria uma "pesca probatória" (fishing expedition), prática vedada em investigações criminais. Também alegaram quebra da cadeia de custódia dos documentos, ausência de garantia quanto à integridade das provas e afronta ao princípio do non bis in idem - já que, segundo a defesa, as mesmas evidências estão sendo usadas em múltiplos processos.
Além disso, destacaram que a médica já foi absolvida no processo principal por falta de provas, tornando injustificável a abertura de novas ações com base nos mesmos elementos.
Voto do relator
O relator, ministro Ribeiro Dantas, votou por negar provimento ao recurso. S. Exa. considerou que as alegações da defesa já haviam sido analisadas e rejeitadas em instâncias anteriores e que não caberia ao STJ reexaminá-las.
A busca e apreensão dos prontuários médicos, segundo o relator, foi legal e fundamentada, baseada em indícios concretos de homicídios ocorridos na UTI sob responsabilidade da médica. O ministro ressaltou que a investigação se limitou a período específico, de 2006 a 2013, e à UTI geral do Hospital Evangélico, não havendo arbitrariedade ou generalização abusiva.
"Pesca predatória"
O ministro Joel Ilan Paciornik apresetou voto vista, abrindo divergência do relator, entendendo que houve a chamada pesca probatória, não sendo admitido investigações especulativas e indiscriminadas, com o intuito de "pescar" qualquer prova para subsidiar uma acusação, portanto a busca e apreensão deveria ser anulada.
Porém, o ministro entendeu que não cabe trancar as ações penais em curso, e manteve a possibilidade de novas requisições de porntuários específicos, desde que justificada a necessidade com base nas informações já constantes das investigações.
O ministro Reynaldo Soares da Fonseca acompanhou o voto de Paciornik. Já o ministro Messod Azulay acompanhou o relator, ponderando que, sem as provas obtidas pela busca e apreensão, os processos não teriam como prosseguir.
Diante do empate na votação, a 5ª turma aplicou o entendimento de que o empate favorece a parte ré e deu parcial provimento ao recurso nos termos do voto divergente do ministro Paciornik.
Com isso, os processos não foram encerrados, porém os juízos responsáveis pelas ações deverão desconsiderar as provas anuladas.