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porto velho, terça-feira 6 de maio de 2025
BRASIL: Nas ações que contestam trechos da Lei da Igualdade Salarial, o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, defendeu afastar qualquer possibilidade de divulgação, nos relatórios de transparência salarial, de valores vinculados a cargos ou funções identificadas; e de invalidar a necessidade de implementação de plano para mitigação de desigualdade salarial nos casos de empresas que tenham justificativa válida para isso, baseada na CLT.
A lei em questão, de 2023, trata da igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres. Ela estabeleceu obrigações para empresas com cem ou mais empregados.
O relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios, previsto na norma, busca comparar de forma objetiva os salários, as remunerações e a proporção de ocupação de cargos. Ele é elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) com base em dados do sistema de prestação de informações trabalhistas ao governo federal.
A regulamentação da norma estipulou, por exemplo, que o relatório precisa ser publicado nos sites ou nas redes sociais das empresas. Conforme a lei, também é preciso apresentar um plano de ação para corrigir eventuais discrepâncias salariais.
A norma foi regulamentada pelo Decreto 11.795/2023. Este, por sua vez, foi regulamentado pela Portaria 3.714/2023 do MTE. Ambos citam diversas informações que devem constar do relatório, o que inclui os cargos ou as ocupações, com as respectivas atribuições, e os valores das remunerações.
Duas ações no Supremo Tribunal Federal contestam pontos da lei. Uma delas foi movida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo (CNC). Já a outra é do Partido Novo.
A CNI e a CNC alegam que a divulgação dos relatórios de transparência salarial causa dano injusto às empresas e que a lei ignora desigualdades legítimas e objetivas, como o tempo na função e na empresa e a perfeição técnica do trabalho. Já o Novo alega que os relatórios expõem informações sensíveis sobre estratégia de preços e custos das empresas.
Na visão de Gonet, um trecho da lei permite a interpretação de que empresas devem apresentar e implementar o plano de ação mesmo se as desigualdades salariais tiverem “justificativas legítimas”.
Ele se refere ao § 2º do artigo 5º da norma, segundo o qual tal plano de ação deve ser implementado “independentemente do descumprimento” do artigo 461 da CLT.
Esse trecho da CLT prevê a igualdade salarial para todo trabalho de igual valor e idêntica função prestado à mesma empresa, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade. Mas afasta tal exigência caso o empregador tenha um quadro de pessoal organizado em carreira ou plano de cargos e salários, com promoções por merecimento e antiguidade; caso o trabalhador seja readaptado em uma nova função por deficiência física ou mental; e caso os empregados não sejam contemporâneos no cargo.
Segundo o PGR, a Lei de Igualdade Salarial desconsidera as hipóteses de desigualdade de remuneração “eventualmente lastreada em justificativa lícita, razoável e admitida pelo ordenamento jurídico”.
Assim, empregadores em situações distintas são tratados de forma idêntica — tanto aqueles “que adotam práticas discriminatórias” quanto os que atuam de acordo com a CLT.
Para Gonet, não há por que obrigar um empregador “que já não pratica indevida desigualdade remuneratória” a implementar um plano de combate à discriminação salarial.
Quanto aos relatórios de transparência salarial, o PGR entendeu que, apesar de haver determinação para que os dados sejam publicados de forma anonimizada, a lei e sua regulamentação permitem a identificação dos empregados a partir “da simples correlação entre cargo e valor do salário”.
Na sua opinião, isso viola a privacidade, a intimidade, a proteção dos dados pessoais, a livre iniciativa e a livre concorrência.
Para ele, a obrigação de divulgação desses relatórios desconsidera as hipóteses legítimas de desigualdade salarial previstas na CLT, além de “contingências norteadoras do desenvolvimento profissional individual, tais como o merecimento e a antiguidade no posto ou função”.
Mais do que isso, tornar públicos tais dados pode causar danos irreversíveis às empresas “perante a opinião pública” e estimular a suposição geral de que elas estão implementando práticas discriminatórias contra mulheres.