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    porto velho, sábado 2 de agosto de 2025

Crônica de Fim de Semana: O ódio que adoece o Brasil e nos afasta uns dos outros

E o pior: está em todo canto — em casa, na rua, no ambiente de trabalho, no lazer, na imprensa, e até na caneta...


Arimar Souza de Sá

Publicada em: 01/08/2025 17:43:55 - Atualizado

CRÔNICA DE FIM DE SEMANA

O ódio que adoece a alma do Brasil e nos afasta uns dos outros

Arimar Souza de Sá

foto - edição Rondonoticias

Os dias que correm têm imposto um pesado ônus à vida de todos nós — sobretudo àqueles menos favorecidos pela sorte. Os noticiários estão carregados de fatos ruins, com a dor dando lastro a batalhas penosas. É a tal da briga do bem contra o mal.

Vivemos tempos em que o ódio parece ter feito morada no coração de muitos brasileiros e, como um veneno servido em pequenas doses diárias, ele vai entorpecendo o espírito e enferrujando os sentimentos mais nobres. E o pior: está em todo canto — em casa, na rua, no ambiente de trabalho, no lazer, na imprensa, e até na caneta... Como fogo de palha, se alastra rapidamente e consome tudo ao redor: amizades, famílias, vizinhanças e, principalmente, a paz interior — pois vitima tanto o odiento quanto o odiado.

Há homens — e não são poucos — que ruminaram e cultivam o ódio durante toda a vida. Alimentaram mágoas como quem cultiva espinhos em vez de flores. Armazenaram ressentimentos como quem guarda um punhal no bolso, esperando o momento certo de ferir alguém para satisfazer seus instintos bestiais e dar o troco. E nesse apego às feridas, adoeceram — tornaram-se pessoas sem vida, sem rumo, amargas. O corpo se curvou, o espírito se fechou, o coração se enrijeceu como pedra, e eles foram se lascando sozinhos, coitados, sem nunca mudar seu modo de ser, e tudo indica que vão para a cova assim.

O ódio, ao contrário do amor, não cria pontes — cava abismos. É uma chaga invisível, uma febre que arde por dentro e transforma pessoas inteiras em ruínas emocionais. É comum cruzarmos com esses seres minúsculos por aí, abrindo fendas e ruínas no meio social em que vivem.

Durante minha vida profissional — ainda na juventude — seja no Incra, no Banco do Estado de Rondônia, na Procuradoria do Estado, ou simplesmente na convivência comum com pessoas do cotidiano, vi essa tragédia de perto. Estive próximo de homens que, mesmo instruídos e capazes, deixaram o ódio enraizar-se como erva “braba” em terreno fértil. Era repugnante conviver com eles, mas tive que suportar, não tinha a quem recorrer para me ver livre desses tipinhos. Eram prisioneiros de si mesmos, encarcerados em celas cujas chaves haviam eles próprios jogado fora e se debatiam fazendo brutalidade com que estivesse ao seu redor.

Recordo-me, em especial, de um vizinho que tive. Com o passar dos anos, foi se afastando do convívio social. Já não recebia visitas, não aceitava conselhos, falava da vida de todo mundo às escondidas e, quando confrontado, era um covarde — mesmo carregando uma arma de fogo na cintura, em razão da profissão.

Com o tempo, tornou-se como uma nulidade, uma casa sem janelas: a luz não entrava mais e o ar já não circulava. Já abraçado à solidão, somada ao ódio e à inveja que ruminava, foi consumindo a si próprio dia após dia e se desfazendo por dentro, como carniça que apodrece ao relento. Sua existência tornou-se um lamento digno de pena e acabou isolado do convívio com os demais vizinhos.

Hoje, o Brasil vive assim — uma crise que vai além da inflação, dos escândalos ou da instabilidade política. A verdadeira crise está instalada na alma da nação. O ódio tornou-se o epicentro de tudo — como um terremoto silencioso que trinca os alicerces invisíveis da sociedade. Ele se alastra nos discursos, com o intuito de minar o adversário; se espalha nas redes sociais; se infiltra nas rodas de conversa; e se entranha até nos lares mais antigos. Amigos de infância se evitam, irmãos se bloqueiam, colegas se atacam. O Brasil adoeceu, está partido — e não apenas no mapa.

É urgente, então, que surja uma liderança que una, que pacifique, que cure esse “Brasilzão de Meu Deus”. Alguém com a estatura de Ulysses Guimarães, que ergueu a Constituição e a denominou de “Cidadã”, como quem levanta um livro sagrado em pleno campo de batalha. Dr. Ulisses foi homem de diálogo e coragem serena, que via no adversário um cidadão a ser ouvido, e não um inimigo a ser esmagado — como fazem hoje com o ex-mandatário da nação. Precisamos de um nome cuja ideologia não chafurde na vermelhidão, que não grite para se impor, nem crie narrativas para ludibriar o povo, mas que fale para reconciliar.

Jesus Cristo, em sua infinita sabedoria, ensinou que devemos perdoar “setenta vezes sete”. E mesmo cravado na cruz, no auge da dor e da injustiça, teve forças para dizer: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. De certo, o Pai Celestial sabia que o ódio é como um rio de água contaminada — por onde passa, tudo morre. E que o caminho da vida está no amor, na compaixão, no perdão — e jamais no rancor ou na desforra para saciar o orgulho ferido.

É triste ver amigos antigos, brigarem por conflitos de ideologia, ou marido e mulher que compartilharam alegrias e dificuldades, terminarem seus dias separados por palavras atravessadas, ou por orgulho ferido e não digerido, cultivando a guerra — mesmo tendo gerado filhos.

O orgulho, aliás, é irmão gêmeo do ódio. Ambos moram no mesmo coração trancado por dentro. Impedem o perdão, bloqueiam a palavra “desculpa” e tornam impossível o simples gesto de estender a mão.

Precisamos desarmar os espíritos e dar um tranco no ódio e nas desavenças por besteira. A paz começa dentro de cada um de nós. É preciso coragem para perdoar, grandeza para pedir perdão e humildade para ouvir — sem medir consequências. O ódio mata — se não o corpo, certamente a alma.

O Brasil, polarizado e com tantos miseráveis a mendigar um pedaço de pão, clama por pacificação. Precisa de cura — mas não aquela prescrita por decretos, tribunais ou sentenças frias e desumanas. Ela nascerá no dia em que o coração do povo reaprender a amar e, sobretudo, quando os poderosos deixarem de usar a caneta como instrumento de vingança e a empunharem como ferramenta de justiça, como ensinou Santo Agostinho em sus célebre frase: “Devemos combater o erro, não o homem”.

E somente assim, poderemos reencontrar a paz, reconstruir os afetos e devolver à nação o caminho da concórdia e da esperança que ela tanto precisa.

PENSE NISSO!
AMÉM!



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