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porto velho, quinta-feira 18 de setembro de 2025
BRASIL - "Eu ia fazer o quê? Abandonar ou lutar com ele? As pessoas julgam como se a família tivesse cometido um crime".
O desabafo é de Valéria Aparecida da Silva, que, por oito anos, saía de Itabira, na Região Central de Minas Gerais, uma vez por mês, para visitar o irmão na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Além de encarar a distância de mais de 130 quilômetros entre as cidades, Valéria foi julgada por não deixar o irmão dela sozinho. No período em que o homem esteve no sistema prisional, ela afirma ter gastado cerca de R$ 195 mil.
O caso da família de Valéria é mais um em meio a tantos outros de pessoas que tem um parente em algum presídio do país. De acordo com o projeto “Cadê meus direitos?”, do Centro de Estudos em Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a cada pessoa presa, ao menos outras cinco são afetadas.
Valéria era uma das milhares de mulheres que encararam filas quilométricas, muitas vezes de madrugada, aguardando entrar para a visita. Segundo o projeto, os problemas quando um familiar vai preso atingem, sobretudo, as mulheres, sejam mães, irmãs, companheiras ou filhas.
Aos 19 anos, o irmão de Valéria foi preso em 2010 suspeito de tentar matar um homem que teria assassinado o irmão deles três anos antes. Ele passou por algumas unidades prisionais de Minas Gerais ficando mais tempo na Nelson Hungria. O homem recebeu o alvará de soltura há um ano.
"Meu irmão morava com minha avó e meu pai em Itabira. Minha avó não sabia pegar o ônibus para sair de Itabira e ir a Nelson Hungria. Meu pai era alcoólatra e tudo piorou. A cada visita que fazia, gastava R$ 800, além de R$ 500 com a lista de pertences pessoais que a gente tinha que comprar, enviar e os gastos com advogados. Só o meu marido trabalhava", contou.
Além dos problemas financeiros, Valéria ainda teve que reorganizar toda a vida e dividir a responsabilidade.
"Eu poderia ter me dedicado mais aos meus filhos, ao meu marido. Isso tudo afeta. A sociedade fala que a gente defende bandido, mas a gente defende quem é nossa família", disse.
De acordo com o projeto “Cadê meus direitos?”, o auxílio-reclusão não chega às mãos de quem precisa.
"Ninguém cria filho para estar dentro do sistema (prisional). Psicologicamente, a família se esconde, a sociedade julga mesmo depois que o preso sai. A gente sofre demais", finalizou Valéria.