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porto velho, domingo 29 de junho de 2025
BRASIL: A ampliação da responsabilidade das plataformas de redes sociais, anunciada pelo Supremo Tribunal Federal na quinta-feira (26/6), significa um avanço necessário, mas traz consigo a necessidade de dar mais atenção ao uso de algoritmos para excluir automaticamente conteúdos publicados por usuários.
Para especialistas na área digital ouvidos pela revista Consultor Jurídico, a determinação do Supremo deverá resultar, em um primeiro momento, no aumento da remoção de posts. Por maioria, o Plenário da corte declarou inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que determina que as plataformas só respondem por danos a terceiros em caso de ordem judicial.
“É certo que a decisão tende a impactar de forma relevante o modelo de negócios das plataformas no Brasil, em especial nos casos em que houver recomendação algorítmica, impulsionamento de conteúdo ou utilização de contas inautênticas, tendo em vista a presunção de responsabilidade fixada pelo STF“, afirma o advogado Felipe Leoni Carteiro Leite Moreira, Sócio de Direito Digital do escritório Rayes & Fagundes.
“Essas hipóteses exigirão uma revisão profunda das políticas de moderação das plataformas, com ênfase na verificação de identidade. É provável também que, no curto prazo, as plataformas adotem medidas mais rígidas de controle e intensifiquem a remoção preventiva de conteúdos, em uma tentativa de mitigar riscos jurídicos”, completa.
A automatização para excluir conteúdos procura proteger direitos fundamentais e prevenir danos, “mas a amplitude e a vagueza de algumas dessas categorias pode abrir espaço para interpretações excessivas ou enviesadas, resultando em restrições indevidas à liberdade de expressão”, diz Moreira.
Paula Bernardi, diretora de Políticas Públicas da Internet Society, reconheceu os “desafios reais” de regular as big techs, mas apontou “o risco da responsabilização de intermediários por funções além de sua atuação técnica, por exemplo. O risco, segundo ela, é que as plataformas passem a ser censores prévios, quebrando o modelo descentralizado da internet e podendo comprometer a liberdade de expressão.
“A imposição de presunção de responsabilidade para conteúdos promovidos ou automatizados pode levar a automações rígidas, sem sofisticação para contextos legítimos. Vamos imaginar o cenário onde uma ONG ambiental promove uma campanha paga contra o desmatamento com imagens fortes. Algoritmos rígidos, com receio de responsabilização legal, podem bloquear o conteúdo por ‘violência gráfica’, mesmo que o objetivo seja educativo ou de mobilização social”, afirma.
Bernardi também falou sobre o risco de remoções excessivas de posts em um primeiro momento e de “um possível obstáculo à inovação e competitividade, especialmente para pequenas e médias empresas, assim como novos atores do ecossistema digital”.
Para Moreira, a decisão do STF fortalecerá a segurança jurídica, inclusive porque terá apenas efeitos futuros.
“É importante notar que a decisão dada pelo STF foi dada com modulação de efeitos, quer dizer, ela vale daqui para frente, não afeta os casos julgados até o momento. Então, ela representa uma novidade no sentido de que não afeta o que já foi julgado, o que já foi decidido”, afirma Rubens Beçak, mestre e doutor em Direito Constitucional e professor da Universidade de São Paulo.
“Há uma responsabilização imediata das plataformas que são donas das redes sociais, no sentido da retirada de conteúdo, de uma responsabilização, verdadeiramente, quase que objetiva delas”, completa Beçak.
Já Bernardi reconhece o avanço, mas aponta ser “essencial que haja uma categorização mais precisa e funcional dos diferentes tipos de intermediários envolvidos, de modo a oferecer maior segurança jurídica e preservar a interoperabilidade e a arquitetura distribuída da internet”.
“Esperamos que o Legislativo conduza qualquer revisão do Marco Civil da Internet a partir de uma abordagem multissetorial, com atenção aos aspectos técnicos que sustentam o funcionamento da internet. É essencial que qualquer mudança promova a proteção dos usuários sem comprometer a inovação, a abertura e a natureza descentralizada da rede”, conclui.