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    porto velho, sábado 20 de setembro de 2025

A PEC da Blindagem e o Povo no Meio do Fogo Cruzado


Por Dr. Fadrício Santos

20/09/2025 12:58:27 - Atualizado

A PEC da Blindagem e o Povo no Meio do Fogo Cruzado

Por Dr. Fadricio Santos

O que é a PEC da Blindagem

A chamada PEC da Blindagem, oficialmente Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2021, propõe alterar dispositivos da Constituição para ampliar prerrogativas de deputados e senadores, reforçando imunidades parlamentares e limitando a atuação do Judiciário em processos contra congressistas.

Trata-se de mais um exemplo de legislação casuística, elaborada sob medida para atender a interesses imediatos da classe política, e não ao interesse coletivo. Seu objetivo declarado é proteger o mandato parlamentar; na prática, porém, consolida uma diferenciação injustificável entre o cidadão comum e os que ocupam cargos no Congresso Nacional.

Onde estamos na tramitação

A PEC já percorreu fases importantes na Câmara dos Deputados:

  • Admissibilidade aprovada na CCJC;
  • Comissão Especial com parecer favorável;
  • Votação em Plenário: aprovada em dois turnos no dia 16 de setembro de 2025, com larga margem (353 votos a favor no 1º turno e 344 no 2º).

Agora, a proposta está no Senado Federal, aguardando análise da Comissão de Constituição e Justiça e posterior votação em dois turnos no plenário. Só depois dessa etapa, caso aprovada, será promulgada pelo Congresso — PECs não passam por sanção ou veto presidencial.

A instabilidade entre os Poderes

A aprovação da PEC na Câmara foi lida como um recado ao Supremo Tribunal Federal. O Legislativo tenta reequilibrar forças frente a decisões do Judiciário que atingiram parlamentares. O resultado, contudo, não é equilíbrio, mas tensão institucional.

Criar uma blindagem em reação a julgamentos específicos fere o espírito republicano e aumenta a instabilidade entre os Poderes. Em vez de fortalecer a democracia, a PEC escancara a disputa de protagonismo e expõe fragilidades da ordem constitucional.

O povo no meio da disputa

Enquanto isso, o povo — que deveria ser o verdadeiro beneficiário do processo legislativo — assiste a mais uma cena em que o Parlamento legisla em causa própria. A mensagem transmitida é devastadora: existem dois regimes jurídicos no Brasil, um para os cidadãos comuns e outro para os que detêm mandato.

Esse distanciamento mina a confiança nas instituições e reforça o sentimento de impunidade. Quem paga a conta da instabilidade não são os deputados ou os ministros do STF, mas a população, que vê o debate político se deslocar da agenda de prioridades sociais para a pauta da autoproteção.

A tendência no Senado e o papel do Executivo

O cenário no Senado, porém, é diferente. Há resistências significativas: o presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), já indicou que a PEC pode não prosperar na comissão. Outros senadores, como Eduardo Girão (Novo-CE), a classificam como “indefensável”.

O presidente Lula também criticou abertamente a proposta, chamando-a de “privilégio indevido” e “não séria”. Ainda que o Executivo não tenha poder de veto sobre PECs, suas manifestações públicas influenciam fortemente a base governista no Senado.

Portanto, a tendência é de que o texto seja modificado ou mesmo barrado no Senado. Se, por pressão política, for aprovado como está, é certo que enfrentará questionamentos no STF — que poderá derrubar trechos por inconstitucionalidade.

Reflexão final

A PEC da Blindagem não é um mecanismo de fortalecimento institucional, mas um sintoma da crise de representatividade que assola o Brasil. Em vez de aproximar os poderes e reforçar a confiança pública, a proposta amplia a percepção de distanciamento entre governantes e governados.

Blindar parlamentares contra a Justiça é, em última análise, blindar a classe política contra o povo. Não se constrói democracia estável criando castas intocáveis. O verdadeiro fortalecimento institucional virá apenas quando todos — sem exceções — estiverem igualmente submetidos à lei.

Em meio ao fogo cruzado entre Congresso e Supremo, fica a pergunta essencial: quem defende o cidadão comum?


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